segunda-feira, 28 de março de 2022





 Minha reação instintual: BEM-FEITO!!!!


MINHA REAÇÃO RACIONAL:


Já não há quaisquer controvérsias acerca da nocividade e eventual ilicitude de piadas que envolvam a dignidade humana de uma pessoa quanto à sua raça, etnia, origem e sexualidade, por que então resta quaisquer dúvidas quando se trata da dignidade de uma mulher e o cerne da agressão (sim, houve agressão!) é uma doença sofrida pela mesma e que envolve a sua imagem naquilo que  simboliza a máxima expressão de sua feminilidade: os seus cabelos?


O limite da piada são os direitos da personalidade, ainda mais quando se trata de uma doença sofrida pela vítima. O marido agiu em nome dos direitos de terceiro. E, claro, não caberia um tapa, mas, com certeza o ajuizamento de ação de responsabilidade civil com indenização por perdas e danos morais e materiais. 


E, impressionante como a Academia de Cinema, ao se pronunciar sobre o tema, enfatizou que não tolera agressão física, mas se omitiu acerca de agressões morais.


Enquanto houver a banalização das agressões morais contra a dignidade da pessoa humana e os seus direitos da personalidade as quais eu denomino de vilipêndio espiritual, a vingança privada será recorrente. Com a Justiça  sendo feita, literalmente, de mão própria.

 E PORQUE SEGUIMOS NO MÊS DA MULHER:


O CONFINAMENTO E O CLAUSTRO COMO POSSIBILIDADE DE LIBERTAÇÃO. 


SIM, SER FREIRA PODE SER UMA POSSIBILIDADE DE SUBVERSÃO




Diversamente do que narra o discurso e o pensamento corrente, a opção tida, muitas vezes como residual de adentrar os impermeáveis muros de um claustro, poderia ser, ao invés, a possibilidade de uma vida de maior porosidade com o mundo para as mulheres. Durante séculos e porque não dizer, milênios, a existência feminina circunscrevia-se ao espaço da intimidade, da prisão doméstica. Apenas às mulheres consideradas "públicas" ou que não eram "de família", geralmente, órfãs, filhas bastardas de imigrantes e aventureiros é que poderiam caminhar livremente sobre o chão da vida. 


Às demais, "privilegiadas" e contempladas por estarem inseridas no jogo patrimonial do modelo patriarcal, cabia, restritivamente, estarem sob o látego paterno e deste transitarem para o látego do marido. E bem responderem  às suas funções de reprodutoras e cuidadoras do lar, assujeitadas às ordens do "chefe" da família. Poucas tinham acesso à cultura e à educação. 


O mesmo não se dava com as freiras. Desagrilhoadas da lógica de poder masculina, viviam em irmandade com outras mulheres (e não que nessas irmandades não houvesse opressão no exercício do poder, mas, ao menos, era poder feminino). Nelas, eram facultadas à leitura, ao estudo, à vida intelectual e à prática das artes. A partir delas, a não ser naquelas que até hoje, pouco permitem as incursões para o mundo, tal como a Ordem Carmelita, poder-se-ia transitar, não apenas para as praças e os rincões de suas comunidades, mas para sítios distantes como atividade integrante de suas "missões". 


No Brasil Colônia, por exemplo, as freiras muito rezavam, assim como as demais mulheres. Mas, também, muito cantavam e mais ainda: dançavam! E dançavam danças que jamais seriam permitidas àquelas que tiveram a "sorte" de bem casarem e procriarem. As freiras no Brasil Colônia dançavam o lundu! Dança tida por lasciva e luxuriosa coreografada pelos escravos... E assim, ser freira, poderia representar, mais do que apenas um caminho residual daquelas que estavam perdidas (desvirginadas) ou não haviam conseguido um casamento, ou das que estavam destinadas a oferecer um status de respeitabilidade às suas famílias. Ser freira poderia representar uma carta de alforria do regime de escravidão ao qual estavam submetidas as mulheres no patriarcado...

 A aprovação da PEC das DOMÉSTICAS teve forte IMPACTO nas RELAÇÕES de GÊNERO. 



Há um mito de que as mulheres brasileiras seriam esposas mais dóceis e submissas do que as alemãs, por exemplo, quando o que ocorre é  que a presença da empregada doméstica impede o enfrentamento direto entre homens e mulheres no que tange às tarefas domésticas. Com a aprovação da PEC e a natural diminuição d acontratação desses funcionários que tenderão a migrar para outras áreas, tendo as mulheres avançado muito na conquista do espaço público, ficando bem pouco em casa, as relações entre homens e mulheres dentro do lar tendem a ser mais IGUALITÁRIAS. Caso isso não aconteça, os homens, provavelmente deixarão de sentir o gosto doce, para sentir o gosto amargo da mulher brasileira.

domingo, 27 de março de 2022

 Bom domingo sob os acordes de CLARA SCHUMANN!


"No passado acreditava que possuísse talento criativo, mas desisti dessa ideia; uma mulher não deve desejar compor - até hoje nenhuma foi capaz de fazê-lo. Eu deveria esperar ser essa mulher?". Clara Schumann


Clara Schumann, esposa do famoso compositor Robert Schumann, foi uma criança prodígio, dando o seu primeiro recital público em Leipzig quando contava tenros nove anos de idade. Apresentou-se pela Europa, acompanhada pelo pai, um renomado professor de piano, entre 1831 e 1835, enquanto, também, compunha proficuamente. Já era reconhecida como uma virtuose na França e na Alemanha quando Schumann, aluno do pai dela, começou a cortejá-la. 


Mesmo com resistências de seu pai, Clara e Robert casaram-se na Corte de Apelações de Leipzig quando ela completou 21 anos de idade. Dedicou a sua vida na divulgação das composições de seu marido, mas foi desautorizando-se pouco a pouco a ser reconhecida, também, como uma grande compositora. 


E você, já desautorizou a si mesma e aos seus talentos pelo fato de viver em um mundo pródigo em desautorizar as pessoas pelo simples fato de serem mulheres?




sábado, 26 de março de 2022

 SER BONITA, GOSTOSA (E ATÉ FÚTIL) TAMBÉM É UM DIREITO






Há questões debatidas no feminismo cujos posicionamentos podem levar a uma nova dinâmica de frustração para as mulheres. Uma delas diz respeito ao padrão de mulher atraente. 

Eu já começaria por interrogar se quem critica o dever de ser atraente, em verdade está por demais preocupada em ser atraente. a descontruir esse “dever de ser atrativa”, pois se as mulheres execram os padrões de atração é porque querem ser atrativas fora dos padrões, quando o primeiro passo para essa libertação é, simplesmente não fazer questão de ser atrativa. Mas como a regra humana é a vaidade, continuemos levando-a em consideração. As mulheres intelectuais insistem que o padrão de mulher deve migrar do padrão da mulher bonita e gostosa para o padrão da mulher intelectual e especialista. Ora, em um país onde em torno de 11% da população consegue concluir a Universidade, infiro que é mais fácil alguém se tornar bonita e gostosa do que se tornar uma profissional intelectualizada. Ainda mais se tratarmos de uma grande parte das mulheres brasileiras que são aquelas que vivem nas periferias, das classes baixas , médias baixas e até médias. São geralmente essas que, ao serem brindadas com alguma beleza, podem ficar bonitas e gostosas e desfilarem os seus atributos físicos, seja em escolas de samba, revistas masculinas e congêneres. O que diremos a  elas? Vista a sua roupa, vá estudar naquela escola pública de sua periferia, cheia de marginais e reze pra ter almoço amanhã, porque você está causando frustração nas mulheres que não têm um corpo tão belo quanto o seu? Vá ser uma intelectual (isso sim, talvez um padrão inatingível nesses casos)? Não sou a favor da coisificação da mulher, não importa quem seja ela, até se for uma atriz pornô. Mas sustento que o debate em torno da opressão sofrida historicamente pela mulher deve ter como alicerce a busca pela felicidade de TODAS e não a inveja e a competição. A mulher que vive em função de seu corpo e de sua beleza, por ser bonita e gostosa tem DIGNIDADE e merece RESPEITO. Não sou a favor de nenhum padrão, quer seja o da beleza, quer seja o da intectualização. Quebremos os grilhões do escravagismo! Afinal “CADA UM SABE A DOR E A ALEGRIA DE SER O QUE É”.

 A DAMA E O VAGABUNDO DE PLANALTINA- "Ei, moço, moço! Quer 'namorar' comigo?"

Reflexões para além de surtos psicóticos e abusos sexuais.


Nesta semana um fato inusitado envolvendo uma bela mulher casada e um morador em situação de rua chamou a atenção de todas as mídias. Eis que uma missionária benfeitora de uma Igreja Evangélica, envolvida em projetos de assistência e doações a moradores em situação de rua decidiu por doar a própria carne em comunhão a um desassistido. 


O momento dadivoso teria sumido na poeira da história se o seu marido, um portentoso personal trainer, não houvesse flagrado o ato em plena sagração já que a moça afirmou que naquele instante da comunhão, digno da hóstia de seu propósito, havia visto a imagem de Deus. Em estado de choque e descontrole diante da cena (ou milagre?) que testemunhara, o marido assomou-se para dentro do carro da esposa onde tudo acontecia, arrancou o morador em situação de rua de dentro do automóvel e o espancou furiosamente. Sendo tudo devidamente filmado pelas câmeras onipresentes na atual sociedade da vigilância. 


O evento epifânico levou o marido da missionária e os amantes de ocasião a redutos-limite da transgressão: todos, para as  barras da polícia judiciária, a religiosa, para um leito de hospital psiquiátrico.


Ao refletir sobre o tema, pude, mais uma vez, constatar o quanto o sexo derruba as barreiras das desigualdades sociais e econômicas, sendo essa moça, antes de tudo, um arauto na luta pela Igualdade em todos os níveis e instâncias. E o quanto essa espécie de prática erótica entre pessoas antípodas   está longe de ser excepcional e, muito pelo contrário, é comum e corriqueira, quando a mulher está em situação de vulnerabilidade e, até mesmo, precariedade, e o homem ocupa uma posição social mais favorecida, ainda que esses encontros geralmente se dêem em virtude de um exercício de poder por parte dos homens. Esse fato envolvendo uma bela mulher branca das classes médias e um homem em estado de mendicância, uma aberração que tão somente poderia justificar-se como um estupro por parte do morador de rua ou um surto psicótico por parte da moça benfeitora, quando a mulher e o homem trocam de lugar,  é estruturante nas relações de gênero de nossa sociedade, ao menos, a brasileira, desde os seus primórdios. 


Ou não era corrente os assaltos dos homens brancos e proprietários sobre mulheres escravizadas, e, depois, sobre toda e qualquer mulher em situação de subalternização?


Enquanto às mulheres sempre coube se relacionarem com homens de seu mesmo estrato social ou superior, sendo inimaginável uma mulher se unir amorosamente ou sexualmente com um homem de situação econômica inferior, ainda mais, muitíssimo inferior, aos homens sempre foi permitido e até mesmo incentivado esse trânsito a transpor todas as barreiras de raça e de classe econômica e social através da carne. 


Da perda da virgindade com a empregada da casa familiar aos costumeiros programas com prostitutas quando já casados. E não apenas com prostitutas de melhor trato, as garotas de programa, mas com aquelas que são moradoras em situação de rua. No caso da cidade do Recife, também, com aquelas que são moradoras "em situação de mangue" e que servem aos homens cerca de vinte vezes por dia a fim de se servirem de um único prato de comida, temperado a drogas, ao final de seus "expedientes".


No meu caminho diário para a Universidade, à luz do sol, estou cansada de ver mulheres em condição de rua, em andrajos, aos farrapos, adentrarem os carros de homens bem alimentados e corados,  muitos,  provavelmente, casados, para fins de comunhão carnal. E nunca ouvi falar que, para fazê-lo, esses homens estariam tendo um surto psicótico.


E aqui chego ao ponto que gostaria de acentuar nessa reflexão: O desejo feminino. 


Sim. As mulheres, a despeito de todos os grilhões e condicionamentos sexuais, desejam. E muito. E são capazes de desejarem a despeito de raça, credo e condição financeira e social, diversamente do que "quer" a cultura. Do que pretende a cultura machista e patriarcal. E não cessam de desejar por serem casadas, assim como os homens. E não desejam outros homens por seus homens não lhes satisfazerem, assim como os homens. E tomam as rédeas na direção de seus desejos, assim como os homens.


E, no mais das vezes, desejam, não para exercício de poder e subjugação, mas por simples dádiva e prazer, o que pode ter acontecido com a Dama e o Vagabundo de Planaltina. Diversamente dos homens...



sábado, 19 de março de 2022

 QUAL O PAPEL DA ACADEMIA NA LUTA PELA EQUIDADE DE GÊNERO?


A Academia  tem um papel primacial na construção do discurso feminista. Historicamente, foi é é na Academia que o feminismo é forjado, fecundado e irradia-se para as ruas.  Sendo que, não poucas vezes, são as acadêmicas, as protagonistas do movimento extra-muros das  Universidades. Isso desde Simone de Beauvoir, passando por Luce Irigaray até chegar a Judith Butler, dentre centenas de outras filósofas, sociólogas, psicólogas, antropólogas e juristas. Isso faz do feminismo um dos mais científicos dos movimentos pela equidade.

Não foi sem razão que o historiador Eric Hobsbawn afirmou que o feminismo havia sido o movimento mais importante e desestruturador do séc. XX. Isso não seria possível se o seu discurso não fosse fundamentado em estudos e pesquisas de metodologias rigorosas, comprometidas, antes de tudo, com a ética. 

O papel da acadêmica feminista é olhar, com a máxima agudeza que lhe for possível, a tessitura da malha social, a sua construção e as suas relações de força e poder. É, mais do que dar as melhores respostas, fazer as melhores perguntas. Não apenas capacitar-se a visualizar criticamente o mapa da violência de gênero, mas, ao narrá-las, destrinchá-las e propor novas práticas de atuação e de possibilidades de resistência. 

Enfim, o papel da Academia para o feminismo é um papel matriz, de pesquisa, denúncia, protagonismo, divulgação de conhecimento e informação, propiciando a toda a sociedade uma real possibilidade de transformação. 

Nas fotos abaixo, estou com a querida amiga, colega e companheira feminista, a Professora Carolina Ferraz, em palestra na Procuradoria da República, MPF-PE, sobre Cultura do Estupro e Assédio Sexual e Assédio Moral (Antes da pandemia).

Professoras e Pesquisadoras: Avante!!!! Alunas: Venham!!!!







sexta-feira, 11 de março de 2022

Revolução Pernambucana

 A REVOLUÇÃO PERNAMBUCANA E A CAPACIDADE BRASILEIRA DE TRANSFORMAÇÃO. 

(Ou sobre a ideologia da inutilidade das sublevações no Brasil)



A data Magna que passou a ser comemorada a cada dia 06 de março no Estado de Pernambuco em razão da Revolução Pernambucana nos leva a muito refletirmos  sobre nós mesmos, pernambucanos, e sobre todo o povo brasileiro em sua capacidade de levar a cabo ações e práticas transmutadoras. 


Primeiro, ao questionarmos a invisibilidade histórica dessa revolução de modo a incutir no povo brasileiro um sentimento eterno de constitutivos derrotismo e incompetência revolucionária. Como se em nós houvesse, intrinsecamente, uma incapacidade para a promoção de mudanças efetivas. Os livros de história se esforçaram para nos convencer desse espírito nacional de não vocacionados para as transformações estruturais e mudanças de status quo há séculos. Entendamos.


O movimento brasileiro que consta como sendo a mais significativa revolução iluminista e libertária em nossos  livros de história, sendo inclusive razão de um feriado nacional, é a Inconfidência Mineira. Com todo o respeito a esse movimento e aos inconfidentes, o que ocorre é que a Inconfidência Mineira sequer foi uma revolução ou um movimento efetivo. Foi, ao invés, tão somente, uma ideia, um plano que não foi concretizado. Tendo sido os seus mártires, condenados à morte,  não por terem realizado a revolução, mas, estritamente, por seus atos preparatórios. O mais homenageado deles, Tiradentes, não tem, sequer, existência certa. Ou seja, no dia 21 de abril comemoramos uma Revolução ABORTADA, sequer não vitoriosa, já que apenas uma TENTATIVA de Revolução!. 


O que me indago é se o propósito dessa data é comemorar a "Inconfidência", o projeto de revolução, ou o seu abortamento. Como se fosse uma data feita para nos lembrarmos de nossa incapacidade de implementar projetos de mudança e que, ao tentamos assim fazê-lo, teremos sempre a nossa morte anunciada ainda no período gestacional. Logo, a invisibilidade da Revolução Pernambucana frente à Inconfidência Mineira não se trata, tão somente, de fazer prevalecer os fatos históricos-políticos ocorridos nas regiões Centro-Sul sobre os fatos históricos-políticos ocorridos nas regiões Norte-Nordeste. Trata-se de uma evidente mensagem de DESENCORAJAMENTO transmitida pelas instâncias máximas de poder político a TODO o povo brasileiro. Uma ideologia centenária sobre a inutilidade de nossas sublevações e tentativas de mudanças estruturais. Ainda mais em se tratando de movimentos separatistas. Afinal, no dia 21 de abril comemoramos a nossa derrota o que seria o oposto se a Revolução libertária que comemorássemos anualmente fosse, ao menos, também, a Revolução Pernambucana!


Sim, porque a Revolução Pernambucana foi VITORIOSA! Foi um movimento ILUMINISTA e LIBERAL, um braço da então recente REVOLUÇÃO FRANCESA, eclodindo na América do Sul e capitaneada por brasileiros, homens da terra. Em 1817, derrotamos o PODER CENTRAL, colocamos abaixo a MONARQUIA e proclamamos uma REPÚBLICA! É, originariamente, não do Estado de Pernambuco, mas da República de Pernambuco, a nossa bandeira! Tivemos representação diplomática no exterior. No caso, o Embaixador Cruz Cabugá nos Estados Unidos da América. Durante mais de dois meses fomos uma República independente e vencedora. Mas esse fato histórico deve ser silenciado, afinal, não diz respeito a comemorarmos a nossa derrota e o nosso destino incontornável de  derrotados em nossos projetos de mudança. Diz respeito a comemorarmos a nossa VITÓRIA e a nossa potência transformadora, proclamada não por um português como ocorre na celebração da independência do país, mas, independência proclamada pelo povo brasileiro!


A Revolução Pernambucana não era comemorada em nosso próprio Estado. Passou a ser celebrada, recentemente, a partir de 2008 e só no ano de 2017 tornou-se dia feriado. Trata-se de Revolução ainda desconhecida pela maioria esmagadora de nossa população.  A hipótese que ora advogo é a de que  o seu total desconhecimento em âmbito local e nacional tem o condão proposital de perpetuar o sentimento de eterna pequenez e insignificância do povo brasileiro. O sentimento de inutilidade de nossas práticas de mudança. Mais ainda no que diz respeito às mudanças na estrutura do poder. Acostumamo-nos a sermos elefantes gigantes que desconhecem totalmente o próprio peso e vivem como se tivessem o peso de uma minhoca! A nossa cidade do Recife, cidade de raiz mercantil, libertária, vocacionada para a circulação de riquezas com maravilhosos portos, seria para ser, no mínimo, algo próximo à cidade de Roterdã! Assim como cada cidade brasileira e respectivas vocações! Vivem todas muito aquém do que realmente poderiam ser!


Mas, sigamos, é hora de revermos a nossa história e os seus discursos  inferiorizadores; incapacitantes, despotencializadores, perversos e traumáticos.


Vamos pôr abaixo, um a um, os nossos complexos, inclusive aquele que nos coloca em total dependência e subalternização ao pai-Estado e que nos leva à eterna nostalgia de um Rei. 


Sejamos o que realmente somos! Transformadores, potentes, capazes e RICOS!


O brasileiro, junto a sua história tem sido morto a cada dia. Mas, já está mais do que na hora de proclamarmos a nossa potência transformadora, a nossa força vital, que assim como o Estado de Pernambuco é  IMORTAL.

quinta-feira, 10 de março de 2022

Semana da Mulher em 2021

 PANDEMIA DAS SOMBRAS - SEMANA DA MULHER NO ANO DE 2021


A Semana da Mulher no ano de 2021 foi a mais triste desde a sua instituição. Igual ou pior do que o foi durante as duas Grandes Guerras Mundiais. Se em 2019, 243 milhões de mulheres e adolescentes sofreram violência doméstica ao redor do mundo, em 2020 esse número, no mínimo, triplicou. 


São as mulheres que mantêm o mundo girando durante a Pandemia do Coronavírus. São elas o número massivo de enfermeiras, técnicas de enfermagem, médicas e profissionais de limpeza que estão na linha de frente na recepção, no acolhimento e no tratamento dos doentes. 


São as mulheres que estão na linha de frente nos espaços domésticos em cada país ao redor do globo nos quais somamos mais de dois bilhões de confinados. Nesses espaços são elas em acachapante maioria que cozinham, limpam, lavam, cuidam dos filhos também confinados e os educam extra e institucionalmente, já que passaram a ser dublés de professoras e coordenadoras de escolas. 


São as mulheres que se tornaram as cuidadoras permanentes e, em menos de um ano com máxima especialização, não apenas de suas famílias nucleares, mas de seus idosos e deficientes mais próximos e distantes.


E são essas mesmas mulheres que estão sofrendo violências domésticas e sexuais a um só tempo, por todo o planeta em uma magnitude jamais vista: Agressões físicas, psicológicas, patrimoniais... A cada dia, uma multitude de mulheres está sendo assassinada. As vítimas dessas violências superam em números, as vítimas do coronavírus. Vivemos o que a ONU Mulheres chamou de PANDEMIA DAS SOMBRAS.


Em meio à uma Peste, a uma crise sanitária, a uma hecatombe, a uma doença mortífera cujo principal sintoma é o comprometimento das vias respiratórias. Ao menos nessa Semana da Mulher, indague à mulher mais próxima, àquela que está ao seu lado: "VOCÊ ESTÁ CONSEGUINDO RESPIRAR?".

quarta-feira, 9 de março de 2022

ALEXANDRA KOLLONTAI

ENTRE A CONQUISTA DE DIREITOS E AS "NECESSIDADES MATERIAIS"

REFLEXÕES A PARTIR DO CASO DE ALEXANDRA KOLLONTAI






Em 2017 comemorou-se o centenário de uma revolução crucial: A Revolução Russa de 1917. Falarmos sobre a Revolução Russa não significa fazermos apologia do comunismo ou de quaisquer ideologias governamentais, mas falarmos sobre lutas por direitos que têm sido encetadas pelas minorias no decorrer do séc. XX e que encontraram e encontram dificuldades em serem consolidados nos mais diversos regimes políticos, inclusive no próprio comunismo. 

Em se tratando de lutas de gênero, escolho aqui, fazer uma homenagem à Revolução Russa através da imensa feminista, ALEXANDRA KOLLONTAI. Alexandra, nascida em berço oligárquico-latifundiário, abandonou suas origens nobiliárquicas e agregou-se à luta dos trabalhadores, tendo sido uma intelectual autodidata, uma vez que lhe fora cerceado o direito à plena educação. Foi ativíssima militante comunista durante toda a sua vida, havendo integrado o grupo que lutou e conseguiu, logo após a Revolução Russa de fevereiro e outubro de 1917, a decretação das seguintes Leis, já em 1920: Descriminalização do aborto em quaisquer circunstâncias, divórcio e a possibilidade de uniões erótico-afetivas livres. 

A Rússia foi o primeiro país do mundo a descriminalizar o aborto em 1920. Em razão de problemas econômicos e em decorrência da pressão da ala mais conservadora dos bolcheviques, esses direitos passaram por mitigações, chegando Alexandra a sofrer um "exílio branco" ao ser enviada para fora da Rússia em "missão diplomática". Com a ascensão de Stálin, esses direitos foram mais e mais desafiados e houve um franco retrocesso em muitas conquistas das mulheres. Militante do Direito e do Amor, Alexandra, dentre outros livros, escreveu a "Autobiografia de uma Militante Comunista Sexualmente Emancipada". 

Todos esses fatos têm muito a nos ensinar e nos leva a fazermo-nos, principalmente, as seguintes indagações: O quanto as liberdades e os direitos podem ser cerceados em nome de alegadas conquistas econômico-materiais? O quanto essa contradição existe, de fato? O quanto ao ser essa escolha lançada como uma "Escolha de Sofia", existe subjacente à essa dicotomia uma verdade mais profunda que é mascarada por essa binariedade, tal como uma irresponsabilidade quanto à elaboração de políticas públicas que preservem os direitos e as liberdades alcançadas?

 Isso é urgente, não apenas para entendermos o que ocorreu após a Revolução Russa quanto aos direitos sociais e das minorias originalmente conquistados, mas para, principalmente, entendermos e nos questionarmos sobre a procedência atual em abrirmos mãos de conquistas sociais e de direitos individuais em nome de uma eventual "necessidade material". Não se trata de alçarmos a bandeira vermelha, mas de assumirmos que o nosso sangue é vermelho e o quanto estamos dispostas e dispostos a oferecê-lo em sacrifício do que nos esmaga e nos oferece em troca, tão somente, a face exangue da palidez.

DEUSA PRA CASAR PUTA PRA TREPAR

 DEUSA PRA CASAR, PUTA PRA TREPAR





DEUSA PRA CASAR, PUTA PRA TREPAR

Sem retirar uma vírgula de toda indignação nacional e internacional em torno dos áudios vazados de um ora quase-não parlamentar, ao assistir, ontem, a um outro vídeo no qual um motorista de ônibus do Paraná disse que iria fazer horas extras a fim de conseguir casar-se com pelo menos duas ucranianas, em razão do qual foi demitido da companhia de transportes, pude constatar de forma veemente e incontroversa o preconceito e a misoginia nacional e internacional CONTRA A MULHER BRASILEIRA.

Em ambos os casos que geraram comoção, tendo o primeiro dado azo a editoriais nos principais periódicos internacionais e o segundo ensejado a demissão do motorista, os agressores afirmam e reafirmam que as ucranianas são DEUSAS e que desejariam CASAREM-SE com elas a fim de fazerem o que elas bem quisessem e muito mais por toda a vida. O que causou maior repúdio na fala do primeiro foi afirmar que "as ucranianas são fáceis porque são pobres", afirmação, inexoravelmente, deplorável, pois mesmo que a Ucrânia seja considerada um dos países mais pobres da Europa, o que não torna as suas mulheres "fáceis", há o agravante de o indigitado se referir a mulheres que estão vitimizadas por uma Guerra. 

Em um vídeo que circula na Internet, gravado por uma ucraniana que já viveu no Brasil, a bela moça, ao expressar toda a sua revolta com o fato, não sem deixar de agradecer ser chamada de Deusa, afinal as ucranianas são deusas mesmo,  não deixa de citar a condição de miserabilidade das "faveladas brasileiras", portanto mais pobres do que elas. 

Se um brasileiro fez a infame afirmação de que as ucranianas são fáceis porque são pobres e chamar um povo europeu de pobre, ainda mais sendo um latinoamericano, talvez seja mais indigesto do que chamar alguma mulher europeia de fácil, desde que o território brasileiro foi invadido pelos europeus, as mulheres brasileiras são chamadas de lúbricas, devassas, e pior do que fáceis, já que para ser fácil é preciso ser antes assediada: Oferecidas.

Uma vez que esta condição de "oferecidas" partiu de um estigma que recaiu, inicialmente, sobre as índias e as escravas negras (não sobre as brancas europeias que para aqui vieram, é claro), com a miscigenação, ser fácil, ser pobre e ser prostituta passou a ser a imagem da brasileira que corre o mundo e é alardeada em todos os hemisférios. E muito mais do que causar indignação, essa fama difamatória foi ostensivamente capitalizada pelas políticas de Estado Brasileiro, acentuadamente durante os governos militares, sendo, então, as brasileiras oferecidas pela própria Embratur no mercado internacional como uma "commodity". 

Enquanto os brasileiros pretendem mais arduamente trabalharem para com uma branca europeia se casarem, os europeus desde sempre pretenderam apenas  juntar mais  algumas moedas para com as brasileiras se lambuzarem e, depois, as descartarem. 

Sim, prendam (o que é de justiça) os homens que afirmam que as ucranianas do primeiro mundo são fáceis porque são pobres, assim como prendam por todo o planeta, os homens que dizem que as brasileiras são  prostitutas porque são faveladas do terceiro mundo. 

Afinal, Deusa Branca é pra Casar, Puta Brasileira é pra Trepar.








terça-feira, 8 de março de 2022

A Desigualdade não é Doce nem é Rosa


 

 POR QUE TERMOS MULHERES NO PARLAMENTO É TÃO IMPORTANTE?


A cada eleição os reclames acerca da participação das MULHERES na POLÍTICA se alastram sob os argumentos da importância da igualdade numérica na ocupação das cadeiras em nossas Câmaras Municipal, Estadual e Federal.


Neste Dia da Mulher, chamarei as suas atenções para o fato de que termos mulheres LEGISLADORAS não atende tão somente a um equilíbrio de gênero, a um preenchimento de "cotas", mas a um pressuposto essencial para que conquistemos direitos e avancemos na luta pela dignidade feminina. A maioria das leis que tratam sobre matéria que diga respeito à educação, saúde, segurança e enfrentamento à violência contra as mulheres foram propostas por MULHERES! 


Durante esta Semana da Mulher, trarei alguns desses exemplos a se iniciar pela atual vereadora, ex-Deputada Federal por São Paulo IARA BERNARDI.


Vejamos algumas das mais importantes conquistas que alcançamos  através de seu trabalho no Parlamento:


2001 - Autora do Projeto de Lei que criminalizou o ASSÉDIO SEXUAL.


2004 - Autora do Projeto de Lei que criminalizou a VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, passando esta a ser tipificada em nosso Código Penal.


2005 - Autora do Projeto de Lei que levou à reforma do Código Penal, cujas importantes medidas foram:


1) Extirpar o qualificativo "MULHER HONESTA".


2) Extirpar o CASAMENTO DO  ESTUPRADOR COM A VÍTIMA do estupro como hipótese de extinção da punibilidade do estuprador.


3) Revogar o CRIME DE ADULTÉRIO, que apenas criminalizava as mulheres e não os homens.


4) A criminalização do ESTUPRO MARITAL. 


Neste DIA DA MULHER que demos VIVAS a IARA BERNARDI e às LEGISLADORAS de nosso País!!!!




 Sempre que me perguntam: "POR QUE AVANÇA TÃO ASSOMBROSAMENTE A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO BRASIL E NO MUNDO?", a minha resposta é sempre curta e rápida: "PORQUE ESTAMOS ALCANÇANDO O PODER". Ato contínuo, me perguntam: "E POR QUE JÁ EXISTIA A VIOLÊNCIA  ANTIGAMENTE?", a resposta me vem ainda mais fácil: "PARA QUE SEQUER COGITÁSSEMOS ALCANÇAR O PODER". 


Sim, estamos alcançando o poder. Há muito, ainda, por óbvio, a conquistar, os desafios e obstáculos são inumeráveis mas não suficientes para nos deter.


Trago aqui apenas alguns números que são sobremaneira significativos e revelam que estamos escalando o poder econômico, político e social com a força de um tsunami:


As mulheres são maioria no ensino médio em 73% dos municípios brasileiros, sendo a maioria dos estudantes em todas as capitais do país;


As mulheres progridem mais do que os homens na educação, sendo delas o maior número de concluintes em todos os seus graus;


Nos cursos de nível superior, o número de mulheres representa 62,9% do total de concluintes de todo o Brasil;


Pesquisa feita pela Faculdade de Medicina da USP aponta que o número de mulheres que entram nos cursos de medicina em todo o país é superior ao número de homens desde 2009, sendo que as médicas são a maioria dentre os profissionais com idade inferior a 29 anos;


Na faixa que vai até os 25 anos de idade, as mulheres representam a maioria (64%) dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB);


As mulheres também são a maioria dentre aqueles que exercem a arquitetura no Brasil (63, 10%), sendo que em apenas dois estados brasileiros, a maioria é de arquitetos;


O número de mulheres brasileiras que concluem os seus cursos de doutorado no exterior já ultrapassou o número de homens;


Atualmente, as mulheres ocupam 69% dos cargos de Liderança em Comunicação no Brasil;


Na política ainda há muito a conquistar. Em sendo o centro nevrálgico do poder, de onde partem as leis que promovem a igualdade, a luta é desafiadora e renhida. Mas as experiências além de nossas fronteiras nos mostram, sim, que os obstáculos poderão vir a ser debelados.  Em países como Ruanda e Andorra, as mulheres já são a maioria no parlamento. Ainda nessa esfera da vida pública, um estudo publicado pelo Journal of Economic Behavior & Organization apontou que a corrupção é menor nos países nos quais as mulheres têm maior participação no governo. Vamos então, firmes, devagar e sempre, firmes, devagar e sempre...


Se as mulheres são maioria esmagadora em profissões relacionadas às áreas das ciências  humanas, mesmo, nas ciências ditas "duras", aquelas matematizadas, o número de mulheres exercendo profissões como a de engenheira, disparou no país. Números  do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), revelam que a participação das mulheres nas áreas de exatas recrudesceu, aceleradamente, de 2011 até 2016. Os dados do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) confirmam que o número de mulheres engenheiras registradas, por ano, no sistema passou de 13.772, em 2016, para 19.585, em 2018, um crescimento de nada menos do que 42%!  Ainda, de acordo com o Confea, o número total de engenheiras ativas no Brasil, hoje, é de 196.372. Se, antes, as mulheres apareciam timidamente nas salas de aula voltadas às tecnologias, hoje, as suas presenças pululam e a cada dia é mais expressiva a ocupação de mulheres em cargos de liderança no setor.


No empreendedorismo, o número de mulheres tem crescido aos galopes. Segundo estudo conduzido pelo SEBRAE, no ano de 2017 computaram-se 24 milhões de empresárias contra 25 milhões de empresários, uma diferença tida como pequena para o setor. A ainda melhor nova é que, nos novos negócios, as mulheres superam os homens em quase um ponto percentual, sendo um total de 14, 2 milhões de microempresárias no Brasil. A mulher empresária revela um maior compromisso social, sendo que os negócios ligados à saúde, aos serviços sociais e à educação são, em sua maioria, empreendimentos femininos.  A cada dia 19 de novembro, comemora-se o Dia Mundial do Empreendedorismo Feminino e as brasileiras afirmam que, apesar das adversidades, têm muito a comemorar, uma vez que, além de serem líderes da metade das corporações nacionais, as mulheres empreendedoras têm se mostrado mais ousadas do que os homens empreendedores, já que a inovação está presente nos negócios femininos em cinco pontos percentuais a mais. 


 E o número de famílias comandadas por mulheres deu um salto de 105% de 2001 a 2015 no Brasil! E não estou falando, apenas, de mulheres que criam seus filhos sozinhas sem a contribuição dos ex-companheiros. Nas famílias nas quais há marido e filhos, a chefia feminina subiu 551%! De 1 milhão em 2001 para 7 milhões em 2015! E nas famílias de casais sem filhos, aí que as mulheres se tornaram mesmo as poderosas chefonas das famílias. Nessa última situação, o aumento das mulheres como maiores responsáveis pelo sustento econômico do lar, tornando-se as "chefas" da família teve um salto de 822%! Atualmente, 40% dos lares brasileiros têm as mulheres como seus líderes econômicos e financeiros.


E como para as mulheres nem o céu é o limite, O número de mulheres no comando de uma aeronave no Brasil teve um aumento de 106 pontos percentuais no exíguo "espaço" de tempo de três anos, ou seja, de 2015 a 2018! Já se foi o tempo em que cabia à mulher só pilotar fogão!


Last but not least, mesmo nessa sanha de alguns por sermos exterminadas, existimos em maioria no país. No Brasil as mulheres são 51,7% da população, 52% do eleitorado e enquanto, hoje, a expectativa de vida dos homens é de 73 anos de idade, a das mulheres é de 80 anos.


Ou seja, a violência contra a mulher é proporcional ao incremento de nossas conquistas e é uma reação à desconstrução que temos feito aguerridamente nos núcleos de sustentação do patriarcado.


Mas sinto dizer: Não vai adiantar. Podem aqueles que não suportam dividir conosco o estatuto da igualdade e da solidariedade, continuarem como bestas-feras desatinadas, descompensadas e histéricas no desespero dos que temem conosco compartilhar o poder. 


Podem continuar a xingar-nos,a detratar-nos, a nos vir com palavreados chauvinistas e risinhos nervosos, a apontar-nos facas, a nos mirar com revólveres, a lançar-nos paus e pedras, a estuprar-nos, a denegrir-nos, a difamar-nos e a injuriar-nos. A nossa gana é irrefreável e, juntas, nos multiplicamos e representamos umas as outras.


Podem continuar. É inútil. Digerimos o fel inoculado pela violência transformando-o em sangue que borbulha em vitalidade e força.


Sinto muito, estamos, sim, alcançando o PODER. E preparem-se: Isso é só o começo.



domingo, 6 de março de 2022

O Falo do Mamãe Falei

 O FALO DO MAMÃE FALEI 


Não me causou nenhuma espécie e espanto  as infames e abomináveis falas do parlamentar edipiano vulgo "Mamãe Falo", ôps! "Mamãe Falei", uma vez que estão totalmente de acordo com os useiros e vezeiros discursos do MACHO PADRÃO BRASILEIRO, ainda mais daqueles que integram as elites econômicas ditas "conservadoras".


Não sei se por sorte ou azar, cresci ouvindo falas ainda mais agressivas e piores, pois creiam-me, as declarações do Mamãe Falei não são inexcedíveis no dicionário da cafajestagem, mas estão muito de acordo com o seu aporte pedagógico na caracterização do que seja um homem e como se deva falar um homem no Brasil, ainda mais dentre os seus pareceiros de escrotice. 


Não é sem coerência lógica que ao apresentar a sua defesa, o ainda parlamentar, um típico  macho padrão brasileiro, ao ser pego com a boca fazendo o que lhe é de costume, argumentou como principal e peremptório fundamento a justificar os seus impropérios, o fato de  "ser Homem". Ou seja, o fato inafastável e escusável de pensar, agir e sentir conforme dita e proclama  a cartilha do Macho Padrão Brasileiro.


Ou há algo de novo em nossos concidadãos explorarem sexualmente e afetivamente mulheres em situação de vulnerabilidade e pobreza? Não foi sempre assim desde a escravidão? Não é assim com as moças pretas, pardas, esbranquiçadas que vivem em favelas e diariamente e a cada instante tentam a todo custo sobreviver à miséria e fugirem da Guerra do Tráfico? Ou apenas nos comove a exploração sexual, ainda que apenas intencionada, contra as pobres e vulneráveis mulheres brancas, de olhos azuis e europeias, e não a realizada, a todo o tempo e secularmente, contra as mulheres em situação de precariedade em nossas periferias? 


Ou precisaremos sempre de uma Guerra no Leste europeu ou de uma Copa do Mundo como a da Rússia em 2018, nas quais os machos brasileiros escrotos não poderiam ter deixado de dizer a que tinham ido e onde as mulheres vítimas são "bucetas rosas", para nos indignarmos com as proverbiais práticas historicamente reiteradas dos play(bois) brasileiros?


Desde que as falas do Mamãe "Falo" vieram à tona, muitos homens, inclusive aqueles que têm a minha admiração e respeito, vieram à Ágora virtual e física, mostrarem as suas indignações diante das ignóbeis e machistas declarações de seu irmão de sexo. Rogo aos céus que essas indignações tenham brotado do mais profundo de suas almas e de suas honras e que não sejam simples declarações com as praxes do costume ou, ainda pior, meras conveniências políticas. Pois que, embora envernizados e mais contidos, da nossa cultura brasileira do cafajeste, poucos escapam. Que o digam os Esquerdomachos. É importante que neste momento, os homens brasileiros reflitam, se interroguem e se reconheçam ou não nas falas do indigitado parlamentar. 


Nessa história toda, o que mais me comove são as lágrimas das mulheres, sejam as da embaixatriz ucraniana, sejam as das jornalistas brancas, que demonstram vivo abalo ao narrarem o episódio, embora nunca as tenha visto derramarem uma só lágrima por nossas refugiadas internas, pardas e faveladas, ou, eventualmente, pelas empregadas domésticas de suas próprias casas quando exploradas e seviciadas pelos homens de suas famílias.

Mas, voltemos ao caso específico do parlamentar "Mamãe Falei". O que agrava a sua condição de cafajeste é, além de ter escalado a vida política como um arauto da moralidade e dos bons costumes, a possibilidade de ter ido cumprir a sua agenda de macho escroto em campo de guerra às custas do dinheiro público, o que deve ser investigado. Que o seu mandato, o seu falo e a sua fala sejam cortados. Pela espada da Lei.





 BRUXAS NO BRASIL


Em meio a uma história milenar na qual a violência contra a mulher é um dado constante e assombroso, é um refrigério termos acesso a narrativas que nos falam daquelas mulheres subversivas e transgressoras, dentre as quais as bruxas.


E não me refiro às bruxas idealizadas pela mitologia, mas às bruxas cujas práticas sempre desafiaram o status quo, a marginalização, as religiões e as ciências. Essas mulheres, por terem investido em forças e lógicas outras para a existência, foram cruelmente perseguidas a fim de serem exterminadas. Representavam um modo feminino de viver e de pensar que ameaçava a estrutura patriarcal do saber temporal e do saber espiritual. Estima-se que entre os séculos XV e XVIII, cerca de 100.000 mulheres foram executadas em fogueiras pela prática de bruxaria.


E essas sempre tiveram presença constante na história de formação do Brasil. Se formos falar das bruxas índias nativas, teremos material para um tratado. Mas, restringirei os meus exemplos ao nosso processo colonizatório inaugurado pelos europeus.


Falo das três feiticeiras que viviam na cidade de Salvador corria a década de 1590, antes dessa cidade receber a visita da Santa Inquisição como nos informa o historiador Emanuel Araújo.


Chamavam-se elas: Isabel Rodrigues, de alcunha "Boca Torta", degredada de Portugal para o Brasil em razão de suas práticas feiticeiras, Antônia Fernandes que dizia ter aprendido com o diabo que beber semente de homem fazia querer grande bem e Maria Gonçalves Cajado, de alcunha "Arde-lhe o Rabo". Essa última dizia:


"À meia-noite no meu quintal com a cabeça ao ar, com a porta aberta para o mar, eu enterro e desenterro umas botijas, e estou nua da cintura para cima e com os cabelos soltos, e falo com os diabos, e os chamo e estou com eles em muito perigo".


Chegamos até aqui, porque sempre, de algum modo, praticamos a transgressão, o enfrentamento e a resistência.


E porque sempre, sempre, desafiamos fogueiras com a força de nossa magia.




sábado, 5 de março de 2022

 BÁRBARA DE ALENCAR: AVÓ DE JOSÉ DE ALENCAR E HEROÍNA DA REVOLUÇÃO PERNAMBUCANA DE 1817.





O nosso grande escritor cearense José de Alencar foi um às ao empunhar sua pena e escrever sobre lutas, aventuras e enfrentamentos que forjaram a concertação étnica nacional, dando origem ao povo brasileiro. Teceu suas obras-primas albergado no recôndito confortável de seu lar. No dia 6 de março de cada ano comemora-se o aniversário da Revolução Pernambucana e uma das suas líderes que, de fato, empunhou armas, lutou contra exércitos, aventurou-se pelas terras nordestinas como perseguida política e desafiou o Estado Português e Dom Pedro I, foi a avó de José de Alencar, a cratense Bárbara de Alencar, personagem histórica e heroína daquela que foi a maior revolução do Brasil Colonial. 

Bárbara Pereira de Alencar, nascida na cidade de Exu e criada na cidade do Crato no Cariri cearense, integrava a elite agrária e latifundiária local. Com a eclosão do movimento separatista em Pernambuco que propugnava pela independência da região em face de Portugal e a instituição de um sistema republicano de governo, Bárbara de Alencar integrou-se ao mesmo, liderando o movimento na região do Cariri. Foi a primeira prisioneira política da história do Brasil, tendo morrido em fuga de perseguição política na cidade piauiense de Fronteiras em 1832. 

Foi sepultada em Campos Sales, cidade cearense. Por seu pedido teve um enterro simples, sepultada em uma rede como o eram os seus escravos. Ceci, Iracema, Lucíola, personagens de José de Alencar são belas representações da mulher brasileira idealizada. Mas, a melhor de todas as heroínas de Alencar, e a   mais fiel à  gana, à garra e à altivez da mulher brasileira foi uma mulher real, a sua própria avó, cuja vida heroica transborda para além das páginas de toda literatura.


 Exorcizar o patriarcado tem sido o discurso hegemônico dentro do feminismo atual. E como todo discurso hegemônico, este também nos pede uma análise crítica do discurso e de nós mesmas, principalmente de nossas práticas. Somos todas contra o patriarcado, mas a maioria ainda quer o amor romântico, a maternidade protegida por um pater e a família tradicional (que nada mais é do que a base do modelo patriarcal). E esse modelo, de fato, não só trouxe ou promete trazer desfavores à mulher (ou será que se fosse tão somente negativo, seria o modelo escolhido por boa parte da humanidade há 5.000 anos? Algo a ser pensado...).

 Mas, há um outro algo que me incomoda bastante em muitas de nós que têm em seus discursos, a emancipação em face do modelo patriarcal: o priapismo, um incontornável culto ao totem falo. Levantam a bandeira libertária, muitas têm até independência financeira, mas não podem ver um falo à vista que, imediatamente, se põem a postos e começam a dançar a dança da chuva em torno dele... 

Mulheres, dança da chuva é do neolítico! O falo, não poucas vezes é de puro barro! E não chove é nada! Libertem-se dessa dança em torno do nada e pra coisa nenhuma! Há mais de um século que nos equilibramos sozinhas sobre e em torno das nossas próprias pernas! Vamos cortar esse culto ao falo e essa dança da chuva humilhante com as nossas próprias tesouras! A nossa dança é o frevo!😀

sexta-feira, 4 de março de 2022

 AMAZÔNIA E UCRÂNIA: CONVERGÊNCIAS CONJUGADAS NO FEMININO





Para além do argumento oferecido pelo Governo Brasileiro de que um fator preponderante para que o nosso país condenasse a invasão bélica da Ucrânia pela Rússia, seria a urgência de manter a Amazônia sob o poder soberano do Brasil, posicionando-se de modo a comunicar ao mundo que reagirá a quaisquer possibilidades de intervenção externa, inclusive dos países que compõem a OTAN, há mais em comum entre a Amazônia e a Ucrânia que não apenas a disposição de manter-se inviolável contra eventuais forças imperialistas, não importando se vindas de quais direções, sejam do oriente, sejam do ocidente.


Essa convergência diz respeito ao próprio nome de batismo da região: Amazônia, a terra das Amazonas. 


E Amazonas eram as mulheres guerreiras que segundo contado por Heródoto, viviam no território da atual Ucrânia, na costa do Mar Negro. Elas pertenceriam ao povo Cita que ali teriam habitado em torno do século V a.C. 


Formando uma nação de mulheres valentes e independentes, as Amazonas recusavam a participação de homens em seus grupos, sendo os mesmos apenas raptados e levados às suas tribos para fins de copulação. E uma vez que dessem à luz, meninos, os mesmos eram entregues a outras nações,  sendo criadas pelas Amazonas, tão somente, as crianças do sexo feminino. Segundo Homero, na Ilíada, ao narrar a paixão entre a rainha das Amazonas, Pentesileia, e Aquiles, as guerreiras levavam consigo, inafastavelmente, o arco e a flecha.


Durante as invasões pelo colonizador espanhol do norte do território brasileiro em 1542, ao deslizar uma frota espanhola capitaneada por Francisco Orellana por um imenso rio caudaloso, denominado pelo Frei Gaspar de Carvajal de "Mar Dulce", foram os invasores furiosamente atacados por mulheres guerreiras seminuas. 


A violência do ataque das combatentes de cabelos de ébano, em verdade, índias Ykamiabas, a disporem das mesmas armas  daquelas que viviam no território que é, hoje, a atual Ucrânia e cujos imaginários povoavam a, então, cultura europeia, quais sejam, o arco e a flecha, fizeram-nas irmanarem-se com as  Amazonas das costas do Mar Negro, sendo assim, o então, Mar Doce, batizado como o rio das Amazonas, o rio daquelas que repudiavam com veemência quaisquer estrangeiros que ousassem pôr os pés em seus domínios. 


O espírito guerreiro que habitava o nome daquele rio expandiu-se para toda uma região, a região da Amazônia.


Recentemente, trabalhos arqueológicos têm encontrado na porção oriental da Ucrânia, esqueletos identificados como sendo de corpos femininos, de mais de 2.400 anos de idade, enterrado dentre armas e utensílios identificados como sendo de  integrantes da tribo guerreira amazona. Assim como há alguns dias, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro alegou que devido a uma  possível escassez de fertilizantes provenientes da Rússia em decorrência da Guerra na Ucrânia, um caminho a ser trilhado de modo a evitar eventuais prejuízos da atividade agrícola e uma provável alta inflacionária seria a prática da mineração em terras indígenas.


Que o mesmo espírito de combate e resistência das Amazonas da Ucrânia que, certamente, inspiram o povo ucraniano, continue a mover as bravas guerreiras das tribos Amazônicas.


E que o inimigo interno das tribos, o senhor Jair Messias Bolsonaro se acautele de ter o mesmo fim que teve os invasores espanhóis da frota de Orellana: Ser morto, empalado e canibalizado pelas Amazonas Ykamiabas.

quinta-feira, 3 de março de 2022

 A NEGRA POR DETRÁS DA "NEGRA" DE TARSILA DO AMARAL.


Antecedendo o quadro "Abaporu" e o próprio movimento antropofágico, Tarsila do Amaral concebeu a revolucionária tela "A Negra". Nessa impactante pintura, a boca contorcida, os seios derramados sobre os braços fazem-nos adivinhar a pungência da opressão e a dor dilacerante do feminino negro nos tempos do escravagismo institucionalizado. Tarsila afirmava que havia projetado a negra "a partir de memórias recorrentes que tinha de seus cinco ou seis anos de idade, de ter visto uma velha escrava que vivia na fazenda da família". Sobre as feições dessa escrava, dizia Tarsila: "ela tinha os lábios caídos e os seios enormes, porque, me contaram depois, naquele tempo as negras amarravam pedra nos seios para ficarem compridos e elas jogarem para trás e amamentarem a criança presa nas costas". 

Não há comprovações de que essa prática, que chega a ser aterradora, de fato, acontecesse. Mas, estar essa narrativa pulsando no imaginário popular, revela-nos a violência cotidiana que permeava a aparente harmonia da convivência entre senhores e escravos e que engendrava o inconsciente dos que dela participavam. A principal referência para a Negra de Tarsila, provavelmente, foi uma das amas de leite de seus irmãos, a "mamã Balbina".  Mamã Balbina, uma das que, com a sua própria carne, possibilitou que vingassem as vidas de seus opressores...




 A MULHER QUE SE MAQUIASSE OU ANDASSE SOBRE  SALTOS ALTOS  PODERIA SER CONDENADA À MORTE NA CIDADE IDEAL (NA OBRA  "A CIDADE DO SOL" DE TOMASO CAMPANELLA).


Explico.


É bastante curioso como em muitas obras nas quais se delineiam os traços do que seria uma cidade ideal, a eugenia se faz ostensivamente presente, assim como o detalhamento dos procedimentos para que a cidade gere para si mesma a melhor prole possível. É assim na "República" de Platão, é assim na bela "A Cidade do Sol" (1602) de Tomaso Campanella.  Essa última recebe do próprio autor, também, a denominação de "Diálogo Poético", uma vez que todo o texto é desenvolvido através de um diálogo entabulado entre um "hospitalário" (Cavaleiro da Ordem Hospitalária) e um marinheiro genovês (que teria conhecido a "Cidade do Sol" em seus périplos). A obra dedica várias de suas passagens a questões ligadas à procriação e à condição feminina na cidade ideal. Como as melhores "reprodutoras" seriam mulheres vivazes, coradas, fortes, altas e belas, quaisquer "truques" e ilusões de ótica  que viessem a ludibriar os preceptores e mestres aos quais caberiam organizar as conjugações de corpos na forma ideal, seriam apenados, inclusive com a pena máxima, a capital. Afinal, uma mulher que fosse, em verdade, baixa, pálida e sem viço prejudicaria a compleição da prole a ser oferecida à cidade ideal...


O fato é que nem a cidade ideal é a ideal para as mulheres...




 RESISTIRÁ O  pau-BRASIL?


Muito se fala da dizimação dos nossos ancestrais, os índios, quer por matança quer por miscigenação. De fato, se havia dez milhões de nativos sobre essas terras em 1500, hoje, a sua população está em torno de um milhão. Ou seja, inobstante toda perversidade, própria dos processos de colonização, os índios não desapareceram. Existem, resistem e contam as suas histórias.


Exterminado mesmo, foi  o altivo e portentoso habitante dessas plagas, não pertencente ao mundo humano e  animal, mas vegetal: O pau-brasil, a árvore que nos emprestou o nome de batismo. A árvore que pululava aos milhares em nossa costa, do Ceará ao Rio de Janeiro. A despeito das praias, principalmente, as nordestinas, serem reconhecidas por vastas paisagens de coqueiros, essa vegetação não é autóctone, é importada da Ásia e foi por aqui espalhada, inicialmente, por nosso donatário, Duarte Coelho. 


Da terra mesmo é o pau-brasil. Árvore que foi extraída, surrupiada e praticamente extinguida. Estima-se que mais de setenta milhões de árvores pau-brasil foram arrancadas de nosso solo.


Sim, trazemos em nossa alma mãe gentil o nome de nossas raízes massacradas, de nossos troncos queimados, de nosso  vermelho extraído. 


Mas, de repente, quase como por milagre e vertigem, encontra-se uma árvore  pau-brasil que resiste em meio ao desmatamento, ao  extermínio. Algumas tais como guerreiras valentes, imperam incólumes do alto de seus mais de 600 anos de nascidas, árvores potentes e longevas que são. Quase como se surgissem apenas para nos perguntar: "assim como eu, o  vilipendiado pau-brasil, a quantas resistirá o Brasil?"



 E QUANTO À DOUTRINA DA VIRGINDADE PERPÉTUA DE MARIA?


No Cristianismo Primitivo, a interpretação das Escrituras era a de que Maria teria sido virgem apenas até dar à luz Jesus Cristo. No concílio de Trento, durante a Idade Média, a Igreja publicou que Maria teria sido virgem para sempre. Independente do que está nas Escrituras, para muitos cristãos, crer na virgindade perpétua de Maria é um dogma de fé. Para nós que pesquisamos problemas de igualdade de gênero e direitos da mulher, uma questão fulcral em nossa sociedade de bases judaico-cristãs.


Então lhe pergunto:


Qual a sua interpretação para a virgindade de Maria a partir da letra da Bíblia?


         O EVANGELHO SEGUNDO MATEUS


Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: Estando Maria, sua mãe, desposada com José, ANTES DE SE AJUNTAREM, achou-se ter concebido do Espírito Santo . Mateus 1:18


E José, despertando do sonho, fez como o anjo do Senhor lhe ordenara, e recebeu a sua mulher, Mateus 1:24


E NÃO A CONHECEU ATÉ  que deu à luz seu filho, o PRIMOGÊNITO; e pôs-lhe o nome de Jesus. Mateus 1:25


Não é este o filho do carpinteiro? O nome de sua mãe não é Maria, e não são SEUS IRMÃOS Tiago, José, Simão e Judas? Mateus 13:55


Não estão conosco TODAS AS SUAS IRMÃS? De onde, pois, ele obteve todas essas coisas?" 

Mateus 13:56



 RELAÇÃO SINHÁ E ESCRAVA: INTIMIDADE, SOLIDARIEDADE E HOMOEROTISMO.


Desde sempre, fora e dentro dos livros de história, ouve-se falar sobre uma hostilidade e rivalidade características da relação entre sinhás e escravas. Enfatiza-se a violência empregada pelas sinhás contra as escravas em razão de seus "ciúmes" pelas mesmas estarem sendo "cobertas" pelos seus senhores (como se as relações marido e esposa daquele tempo nas quais as meninas de 12 anos de idade se casavam com os homens de 40 e as de 15, com os homens de 60, até 70, fossem muito apaixonadas...rs). Fazendo  levantamento da literatura de historiadores que ousam enfrentar os saberes históricos cristalizados, como Emanuel Araújo, chego à conclusão que a disseminação do que era, de fato, exceção e não regra, é de cunho ideológico e tem por escopo o ataque milenar ao que hoje denominamos de "sororidade", a rede de solidariedade feminina, essa, também, milenar, a fim de desmobilizá-la e sugar-lhe as forças. O que brota iluminada, nessas pesquisas, é a grande cumplicidade, intimidade e confidencialidade que existia no mundo feminino entre sinhás e escravas (o próprio termo "sinhá" é uma forma adocicada de pronunciar "senhora" produzida pelas próprias escravas). Mas, agora, vamos aonde muitos historiadores não ousam, mas Emanuel Araújo e alguns poucos ousaram: A trivial relação homoerótica entre sinhás e escravas. Essas se davam, não apenas por uma natural inclinação de orientação sexual, mas era propiciada, justamente, pela situação de vida em cativeiro que era comum, mutatis mutandis, a ambas. Exemplos são narrados pelo historiador: Guiomar Piçaro confessara que tivera dos 12 aos 13 anos, experiências sexuais com uma escrava de 18 anos. Como as meninas, geralmente se casavam dos 13 aos 15 anos, não raro, as primeiras carícias de cunho erótico davam-se com as escravas. Começava-se com um cafuné até onde o controle ideológico duvida (ou se esforça por esconder). Maria de Lucena, aos 25 anos, deliciava-se com as escravas da Casa Grande, em particular, com as índias Vitória e Margaída, junto às quais foi flagrada inúmeras vezes em pleno ato "sodomítico". A pena à época era ser queimada e feita "fogo em pó". Mas, o fato é que as oprimidas e adestradas mulheres que assim o desejaram, nem por isso deixaram de "queimar",  fosse nos matagais, nos desvãos, nos becos ou nos quintais. Muito menos de serem íntimas, confidentes e solidárias, apesar do fogo ideológico.



 SABÁ DAS BRUXAS NO BRASIL COLÔNIA.


Em meio a uma história milenar na qual a violência contra a mulher é um dado constante e assombroso, é um refrigério termos acesso a narrativas que nos falam daquelas subversivas e transgressoras, dentre as quais as bruxas. E não me refiro às bruxas idealizadas pela mitologia, mas às três feiticeiras que viviam na cidade de Salvador corria a década de 1590, antes dessa cidade receber a visita da Santa Inquisição como nos informa o historiador Emanuel Araújo. Chamavam-se elas: Isabel Rodrigues, de alcunha "Boca Torta", Antônia Fernandes que dizia ter aprendido com o diabo que beber semente de homem fazia querer grande bem e Maria Gonçalves Cajado, de alcunha "Arde-lhe o Rabo". Essa última dizia:


"À meia-noite no meu quintal com a cabeça ao ar, com a porta aberta para o mar, eu enterro e desenterro umas botijas, e estou nua da cintura para cima e com os cabelos soltos, e falo com os diabos, e os chamo e estou com eles em muito perigo".


Chegamos até aqui, porque sempre houve transgressão, enfrentamento e resistência. (E, claro, muita feitiçaria...)




*

Tela: "O Sabá das Bruxas" de Goya.

 ERAM TROVADORES MEDIEVAIS, APENAS, OS HOMENS?


A resposta é negativa. Apesar da proverbial invisibilidade dada à produção feminina na arte e na ciência, escamoteando uma miríade de práticas e seus produtos que foram ofertados pelas mulheres à História, é possível ter acesso a um movimento poético feminino criado em contraposição ao trovadorismo produzido pelos homens: As Trobairitz. Tratava-se de trovadoras dos séculos XII e XIII que assumiam-se como sujeitos desejantes e não apenas como objetos desejados. Enquanto o trovadorismo masculino era marcado pelo discreto amor cortês a uma dama idealizada, o trovadorismo feminino ostentava um arrebatado amor carnal, atravessado por audácias e ousadias. É o que se pode inferir desses belos versos cantados por uma grande trovadora medieval, a trobairitz, CONDESSA de DIA:


Bela amics, avinenz e bos,

Quora´us tenrai em mon poder,

Et que jagués ab vos um ser,

Et que´us dès um bais amores?

Sapchatz, gran talan n´auria

Que´us tengués em luòc del marit [...],


Belo amigo, charmoso e cortês,

quando ter-vos-ei em meu poder

E que me deitarei ao vosso lado,

E que possa dar-vos beijo de amor?

Saiba que muito prazer teria

De vos ter no lugar do meu marido[...].




quarta-feira, 2 de março de 2022

 DUAS POÉTICAS PARA UM MESMO BRASIL 


Casa Grande & Senzala de Gilberto Freyre  e Tristes Trópicos de Claude Lévi-Strauss são  dois livros que tenho lido e cotejado para compreender a genealogia da violência contra a mulher no Brasil. Mas, dos quais tenho sorvido um sabor, também, puramente literário.


A linguagem freyreana é produto direto do próprio fenômeno de que ele trata: a formação da sociedade brasileira. É uma linguagem brasileira por excelência, fruto das mesmas misturas étnicas por ele problematizadas em seu livro. Uma linguagem leve, sensual, muitas vezes deliberadamente erótica, brejeira. Uma linguagem tecida ao sabor do balanço de uma rede, regada a midubim, acarajé e álcool de cana. Já a linguagem de Claude-Lévi Strauss, também  literária,  embora tecida em primeira pessoa como relato de viagem, traz em si ecos de Marselha.


Evidencia-se nas  páginas de Tristes Trópicos que estamos em "intercurso" com um europeu, com a lírica europeia, inclusive. Ao invés do molejo freyreano, a melancolia  claudeana. Ao invés da literatura feita em carne, a literatura que amanhece entre a vigília e o sonho feito miragem.


São duas antropologias. Duas poéticas. E um mesmo Brasil que merece ser matizado em cores infinitas.




 GILBERTO FREYRE SOBRE O NOSSO IDIOMA: "PORTUGUÊS BRASILEIRO: FRUTO DO INTERCURSO INTELECTUAL ENTRE CATEQUISTA E CATECÚMENO".


"Do menino indígena, já o dissemos, os padres recolheram o material para a organização da "língua tupi": esta resultou do intercurso intelectual entre catequista e catecúmeno. (...)


Quando mais tarde o idioma português - sempre o oficial - predominou sobre o tupi, tornando-se ao lado deste, língua popular, já o colonizador estava impregnado de agreste influência indígena; já o seu português perdera o ranço ou a dureza do reinol; amolecera-se em um português sem "rr" nem "ss"; infantilizara-se quase, em fala de menino, sob a influência do ensino jesuítico de colaboração com os culumins."


Gilberto Freyre in "Casa Grande & Senzala" (1933/2006) p. 220-221.



terça-feira, 1 de março de 2022

 CONFIRMADO! GILBERTO FREYRE, AO FALAR DE ZOOFILIA (E DE HERBOFILIA), REVELA QUE EM 1933, JÁ HAVIA LIDO FREUD...


"Do indígena de cultura totêmica e animista, ficaria no brasileiro, especialmente quando menino, uma atitude insensivelmente totêmica e animista em face das plantas e dos animais (ainda tão numerosos nesta parte do mundo). (...) São as muitas histórias de sabor tão brasileiro, de casamento de gente com animais, de compadrismo ou amor entre homens e bichos, no gosto das que Hartland filia às culturas totêmicas. Histórias que correspondem, na vida real, a uma atitude de tolerância, quando não, de nenhuma repugnância, pela união sexual de homem com besta; atitude generalizadíssima entre os meninos brasileiros do interior. No sertanejo mais do que no de engenho; neste, porém, bastante comum para poder ser destacada como complexo - nesse caso tanto sociológico como freudiano - da cultura brasileira.


Em ambos - no menino de engenho, como no sertanejo -  a experiência física do amor se antecipa no abuso de animais e até de plantas; procuram satisfazer o furor que o instinto sexual madruga neles servindo-se de vacas, de cabras, de ovelhas, de galinhas, de outros bichos caseiros; ou de plantas e frutas - da bananeira, da melancia, da fruta do mandacaru. São práticas que para o sertanejo suprem até a adolescência, às vezes até mesmo ao casamento, a falta ou escassez de prostituição doméstica ou pública".


Gilberto FREYRE in Casa Grande & Senzala (1933/2006) p. 211-212