sábado, 6 de agosto de 2022

 "AVE LIBERTAS" - SOCIEDADE ABOLICIONISTA FORMADA EXCLUSIVAMENTE POR MULHERES NO RECIFE EM 1884.



Se a mulher é o negro do mundo e se identifica com todo tipo de opressão e escravidão, as mulheres pernambucanas não foram infensas ao problema do escravagismo e criaram no Recife, em abril de 1884, a sociedade "Ave Libertas' com fins de militarem na luta abolicionista. A sociedade foi devidamente registrada em cartório em setembro de 1884.


As senhoras pernambucanas das classes mais abastadas junto às das classes menos favorecidas, propunham-se a cooperarem com a abolição da escravidão  no Brasil. Dentre as suas práticas estavam a compra de Cartas de Alforria (compraram 200 delas) e o compromisso de não terem escravos em suas propriedades e de modo algum fazerem uso de qualquer serviço de natureza escrava. Para os já alforriados, as senhoras, voluntariamente, promoviam cursos profissionalizantes e de alfabetização. 


A sociedade "Ave Libertas", fundada no Recife, espalhou-se por todo o Brasil com inúmeras filiais, todas integradas e dirigidas apenas por mulheres.


Quatro anos após a sua fundação o seu objetivo abolicionista foi legalmente  alcançado em 13 de maio de 1888.


Mas, por toda a parte do Brasil e do mundo, em pleno século XXI ainda se vê, agrilhoados, negros e mulheres escravos...

quinta-feira, 4 de agosto de 2022

JULGAMENTO INSÓLITO: O PAPA FORMOSO MORTO, PROCESSADO E CONDENADO 





Julgamentos de animais, julgamento de objetos... Mas há algo mais insólito do que o julgamento seguido de condenação de uma pessoa morta? E de corpo presente? Pois esse fato já se deu. O réu? Um Papa defunto e exumado! Trata-se do caso célebre alcunhado de "Sínodo do Cadáver". Vamos aos fatos...


O caso medonho se deu durante a Idade Média, no séc. IX e foi praticado por uma Papa:  Estêvão I.


Estêvão I acusou o seu antecessor, o Papa Formoso, então já morto há nove meses, de ter cometido os crimes de perjúrio, de ter exercido o ofício de bispo quando ainda era leigo e de ter tentado apoderar-se do trono do papa João VIII quando este ainda era vivo.


De modo que o julgamento fosse levado a cabo, o corpo do Papa Formoso foi exumado, paramentado com os ornamentos e as insígnias papais  e entronizado na Basílica de São João de Latrão. O Papa Estêvão I, de pé em frente ao trono e com o dedo em riste, teceu o seu libelo acusatório diante de um Papa imóvel e resignado em sua condição que não pronunciou uma só palavra e nem se queixou de nada. O Papa Formoso foi julgado culpado pelo juiz que era o próprio Papa acusador. Impossibilitado de cumprir com a pena máxima, a pena de morte, o Papa Estêvão cortou-lhe três dedos da mão direita, usados para dar as bênçãos, declarou todos os seus atos e ordenações inválidos e enterrou-o no cemitério dos estrangeiros. Ainda não satisfeito, desenterrou-o e sacudiu o seu corpo às águas do rio Tibre. 


O fato gerou comoção entre os romanos que começaram a dizer estar havendo milagres nos locais por onde o corpo do Papa percorria sob e sobre as águas. O Papa Estêvão acabou sendo preso e morreu estrangulado na prisão. O seu sucessor, o Papa Teodoro II anulou o sínodo do cadáver e uma vez encontrado o corpo do Papa, mandou que este fosse enterrado com todas as honras na Basílica de São Pedro. Teodoro II baixou uma lei canônica proibindo o julgamento de pessoas mortas. 


Quanto ao fundamento jurídico da anulação do julgamento post-mortem do Papa Formoso este não residiu no fato de ele já estar morto, mas sim,  por não ter tido direito à defesa...


Andrea Campos

terça-feira, 2 de agosto de 2022

 PENA das GALÉS e CANOAGEM: Quem quer ir pra GALERA?


Assistindo à uma belíssima prova da Canoagem, lembrei-me da Pena das Galés.


A pena das Galés era uma pena de trabalhos forçados prevista nas Ordenações Portuguesas e que vigoraram no Brasil durante todo o período colonial e mesmo após a Independência.


Geralmente era cumprida nas Galés, barcos à vela que se utilizavam da força propulsora de corpos humanos a fim de ganharem velocidade. Os remadores, quando apenados, remavam com correntes e grilhões nos pés, sendo açoitados se diminuíssem o ritmo. Apesar de ser uma pena a ser cumprida por tempo determinado, não sendo perpétua, muitos condenados acabavam morrendo de exaustão, pois remavam dia e noite com alimentação precária e pouco descanso. As Galés eram também chamadas de "Galeras".


A Constituição do Império de 1824, aboliu as penas cruéis, dentre as quais a das Galés, mas o Código Criminal de 1830 manteve a sua aplicação, o que não foi declarado inconstitucional por aplicar-se "apenas" aos escravos, não aos homens livres...


Em 1890, finalmente, o Código Penal da República  extirpou a pena das Galés de nossa Ordem Jurídica.


Hoje, extinta a malfadada Pena das Galés, temos a alegria de admirar a estética do remo como esporte, quase um balé que revela de forma sublime a potência do corpo humano.


E, então, quem vai pra "Galera"?rs



sábado, 23 de abril de 2022

 



Vou amar antes que eu me esqueça

que há um laço entre as cores

pontilhando as emoções no vento,

que em cada sorriso desabrochado

se alucina a primavera,

que há um pedaço de mar

no sal decantado na pele,


Vou amar antes que eu me esqueça

que o sol são vários olhos de luz

que escalam o dia pra enxergar a noite,

que em todo abismo há um sonho

de fundo inatingível cujo sonho

é não deixar de ser sonho,


Vou amar antes que eu me esqueça

que o choro é a salvação

para a aridez da alma,

que o sabor da saudade

vem em gotículas na língua,

que é nas asas da madrugada

que a tristeza míngua,


Vou amar

antes que entardeça,

antes que o ocaso pesque da voz

a última palavra 

e o silêncio

fale em mim a expressão do nada.


Vou amar antes que eu me esqueça,

Vou amar para que eu mereça

Ser num grão de amor amada

Na vida repisada no pó da estrada.


Andrea Campos


sexta-feira, 22 de abril de 2022

 22 de ABRIL: DESCOBERTA DO BRASIL.

(O QUE A FLORENÇA DE MICHELÂNGELO TEM A VER COM ISSO E COM O NOSSO CABO DE SANTO AGOSTINHO?)


Tem a ver que quem financiou as esquadras portuguesas  para a descoberta dos novos caminhos para as Índias e a exploração das terras ao sul do Equador foram banqueiros e armadores florentinos.

Sim! Os banqueiros florentinos, Marchionni e Lorenzo de Médici, o grande mecenas de Michelângelo, foram uns dos maiores financiadores para que ocorresse a "descoberta" de nosso território. 


E mais, lembram-se daquele navegador florentino, empregado de Lorenzo de  Médici, e que convivia com artistas como Botticelli, o Américo Vespúcio? Sim? Pois foi ele mesmo! Foi Américo Vespúcio quem capitaneou uma expedição pela costa brasileira em 1501(contratado pelo rei D. Manuel I de Portugal, por supuesto) e andou por aqui pela nossa costa pernambucana, nomeando o nosso Cabo de Santo Agostinho com esse nome, uma vez que passaram pelo cabo no dia dedicado a esse santo. Foi um cidadão de Florença, um italiano renascentista, o europeu que comandou a primeira visita às  terras do que hoje é o nosso estado de Pernambuco, portanto.


Quanto ao dia do "descobrimento", assim como a visita de Américo Vespúcio ao nosso Cabo de Santo Agostinho passarem em brancas nuvens, e o dia 21 de abril ser Feriado Nacional, penso que já ficou claro que feriados referentes a datas nacionais dizem mais respeito à uma arquitetura de poder que atende a interesses e ideologias contingentes do que a importância histórica do fato em si. Festejar europeus em nosso solo, para a nossa identidade contemporânea, fala menos do que um militar no cadafalso.


Mas, é bom, mesmo sem comemorações, sabermos que nos 1500, estávamos, de algum modo, mais próximos do mundo Renascentista de Michelângelo do que poderíamos imaginar.


Arrivederci! Baccio!




sábado, 9 de abril de 2022

 COURTISANE LISANT: AS PROSTITUTAS TAMBÉM LEEM...


Claro que não podemos aplicar a premissa aos tristes trópicos, uma pátria de iletrados e onde a atividade da prostituição ainda é, em uma boa medida, sintoma de exclusão social. Nem podemos afirmar que as cortesãs (prostitutas de alta casta) durante  fins do séc. XIX, não fossem provenientes de estratos sociais menos favorecidos. No entanto, ao menos em se tratando das cortesãs francesas e orientais, tinham acesso à educação básica. Educação essa que, durante muitos séculos, mesmo as mulheres da chamada "elite" no Brasil,  dela foram privadas...




 VIOLÊNCIA SEXUAL NA LITERATURA: "O ASSASSINO DA RUE MONTAIGNE" DE OCTAVE MIRBEAU (1900).


Antes de ser, atualmente, de conhecimento amplo e popular, a literatura em suas obras, não poucas vezes, retratou o violador sexual com a aparência do mais inatacável dos homens, de moral ilibada e alta respeitabilidade social. Assim é sói como é narrado na novela de Octave Mirbeau " O Assassino da rue Montaigne". Na paralisante narrativa, um homem de reputação irretocável estupra e mata as prostitutas parisienses. Esse homem é conhecido por sua amabilidade melíflua, seus modos gentis e suas palavras "simples e fáceis"...


"Ele é alto e bonito; o ar de um cavalheiro. Ele não é mais jovem; sua testa é despida, suas têmporas se tornam desajeitadas, e algumas rugas têm suas bochechas cavadas; mas ele é robusto, dessa robustez encantadora que se esconde sob a elegância de um corpo magro, flexível e nervoso. Sua mente não está sem prazer, e suas maneiras são atraentes. Raramente tenho conseguido encontrar uma natureza mais analítica, mais complicada, mais sutil que a dele. Quando ele quebra uma ação, um sentimento humano, ele realmente surpreende pela curiosidade, a profundidade, a perversidade de suas investigações psicológicas. Uma coisa me preocupa: o olhar dele. Um olhar frio e pálido que penetra por trás, como a lâmina de um surin e não suporta o exame prolongado de outro olhar que cruza o seu. Então ele vai para longe, está aterrorizado, foge de um canto para o outro pálpebra e, eventualmente, esconder, por crouches, tremendo na parte de trás do olho, na sombra dos cílios. É a única falha deste homem impassível, surpreendentemente mestre dele. Mas esse defeito escapa a muitas pessoas e, para perceber que esse olhar contém uma vida misteriosa e conturbada, é preciso ser dotado de alguma observação.


Um dia, em sua casa, onde eu tinha vindo por acaso, eu o vi brincando com uma faca, e foi a primeira vez que tive a sensação muito clara e comovente de que eu estava na presença de um assassino."




domingo, 3 de abril de 2022

 Crendo ou não, sendo ou não ateu, todos os textos sagrados simbolizam verdades, ao menos as verdades produzidas em seu tempo. As que se reproduzem na História são aquelas pressentidas pelo humano como uma verdade profunda e universal. Dentro desse raciocínio, a Bíblia é uma verdade do povo hebraico. A despeito de não acreditar-se na existência de Adão e Eva, não há como desprezar a sua simbologia. Adão e Eva, assim como o mito de Prometeu, nos diz sobre a interdição da realização plena do desejo, sobre a nossa queda ao transgredirmos os limites dessa interdição, ao nos desarvorarmos em direção a ele, escravos de nossas vontades, sem limites, sem freios. O Paraíso não é uma terra sem Lei.





*

Tela de Rossetti.

sexta-feira, 1 de abril de 2022

 "A propriedade é um fenômeno histórico, da alçada portanto da sociologia. A ciência da economia o estuda sob o aspecto econômico; sob o jurídico, a do direito.


A propriedade não é uma criação da lei. Ela surge diante do legislador como um fato, como a "expressão de um juízo sintético a priori, prático", na linguagem incisiva de Kant". 


(Virgílio de Sá Pereira in Direito das Coisas: Da Propriedade)



 Ainda sobre o caráter individualista do conceito romano de propriedade, discorre Ciccaglione (apud SÁ PEREIRA) em seu " Storia del Diritto italiano": Se já no conceito romano da propriedade pouca importância tinha o elemento social, predominando o individual, no conceito dos intérpretes este elemento foi exagerado até o egoísmo, dando os postglosadores ao proprietário, por um lado, o direito de abusar da coisa, e por outro, extendendo-o sobre o fundo, "usque ad coelum", e abaixo dele,"usque ad profundum". Cesare Nani qualifica essa interpretação como "communnissimo erro", corroborada por Ihering que considera como profundo erro essa tese dos juristas. Ou seja, há uma crítica na doutrina tratadista (não encontramos isso nos manuais) de que os romanos não conheceriam a função social da propriedade, portanto, esse entendimento milenar não seria assim tão procedente...


Exemplos aqui do caráter social da propriedade romana (não cai na prova rs): I) Na cultura da terra, quando a tira ao proprietário ocioso e a dá a quem a cultive; II) Na adjudicação da casa em ruína ao condômino que a reconstruiu; III) Na concessão a terceiros da exploração de tesouros em terreno alheio; IV) Na proibição de se enterrarem com o defunto os seus valores. (Exemplos tirados da Edição Histórica de "Direito das Coisas: Da Propriedade" de Virgílio de Sá Pereira).



 E preparando a nossa avaliação de Direitos Reais, no ponto que tange ao direito de propriedade, elaborei a seguinte questão que os meus alunos poderão responder por aqui rs (pensei em fazer isso seriamente, mas prejudicaria os alunos que não têm FB ou que não estão conectados a mim via FB). Bem, lá vai a questão, incluindo, também, direito comparado, afinal estudamos o direito de propriedade, também, no Código Francês (Code Napóleon). Então, vamos lá, treinando pra prova!


Questão

Os códigos civis brasileiros, tanto o de 1916, quanto o de 2002, não definiram a propriedade, como também, não a definiram os romanos, lembrando-nos do que dispunha o Digesto "omnis definitio in jure civili periculosa est". No entanto, o Código Civil Francês, em seu art. 544, define a propriedade desta forma:


"La proprieté est le droit de jouir et disposer des choses de la manière la plus absolue, pourvu qu'on n'en fasse pas un usage prohibé par les lois ou par les réglements".


"A propriedade é o direito de gozar e de dispor das coisas da maneira mais absoluta, contanto que  o exercício desse direito não seja defeso em lei ou pelos regramentos"


Esta definição contém duas cláusulas que se repelem, que se não ajustam, nem podem coexistir. Trata-se do que os escolásticos chamavam de uma "contradictio in adjecto".

Portanto, à luz da ordem jurídica civil pátria, responda e fundamente a sua resposta:


!) Quais são as cláusulas que se repelem no art. 544 do Código Civil Francês? Fundamente.

2) Em que consistem os jus fruendi e o jus abutendi?

3) O Código Civil Brasileiro em seu art. 1.228, ao evitar a definição de propriedade utiliza-se de que técnica para que se entenda o que é a propriedade?

4) Você concorda com a disposição do Digesto de que "definir tudo no direito é perigoso"? Fundamente a sua resposta.


Alea jacta est!rs





 Relendo a "Teoria simplificada da posse" de Rudolf von Ihering a fim de bem elaborar a nossa prova, deparo-me com uma questão muito sensível e que, de tão silenciada, tanto pelos manuais, quanto pela Exposição de Motivos de nosso Código, poucos discutem. Tem a ver com as teorias da posse de Ihering e a de Savigny. É o seguinte. Tornou-se pacífico o entendimento de que na teoria da posse de Ihering há um só elemento, o "Corpus" (teoria objetiva) enquanto que  na teoria da posse de  Savigny constam dois elementos, quais sejam, o "Corpus" e o "Animus Domini". Como vocês, nobres alunos, são adestrados para provas de marcar 'x', nessas provas, continuem marcando essa assertiva como a correta. Mas nas provas dissertativas, vocês podem discorrer que há duas Teorias da Posse em Ihering: a originária, ou primeira versão da sua teoria na qual a posse é tão somente constituída pelo elemento "Corpus" e uma segunda versão dessa teoria que apenas alguns doutrinadores atentaram quanto a ela, tais como Serpa Lopes e Limongi França, que reconhece dois elementos na posse da teoria objetiva de Ihering, quais sejam, o "Corpus" e o "Animus Domini", apesar de terem em ambos seus conteúdos, elementos diversos dos elementos trazidos por Savigny. Essa segunda versão foi publicada por Ihering em sua última obra "Du rôle de la volonté dans la possession" ("O Papel da Vontade na Posse") e é a que, realmente, é esposada pelo Código Civil de 2002. Mas, vai que os componentes das bancas examinadoras da vida não tenham tido notícia disso... Vai ser uma confusão danada na hora da arguição... Melhor deixar quieto...rs



 E até os gênios erram em seus prognósticos...rs Vejam o que diz Ihering em sua Magnum Opus, "Teoria Simplificada da Posse": 


"O 'Direito da Posse na Idade Média e em nossos Tempos', de Burns (1848), é a meu ver, a obra científica mais preciosa de nossos tempos acerca da posse; ela é um verdadeiro modelo. A obra de Burns conservará seu valor para a ciência enquanto a de Savigny não passará de um mero interesse histórico". Gente, alguém conhece esse tão proclamado Burns?rs 


(Abaixo Ihering ao lado de seu "considerado medíocre para a ciência"rs, e que a gente continua citando noite e dia, Friedrich von Savigny).




 A MULHER  COMO  OBJETO DE PROPRIEDADE DO HOMEM  NA  LEI  DAS  XII TÁBUAS ROMANA (450 a.C)

(Ou alguém achou que por estar discorrendo sobre posse e propriedade eu iria deixar de discorrer sobre a condição feminina?)


Organizando os meus livros que tratam de posse e propriedade, fiz uma escavação até a Lei das XII Tábuas.  Fui ao Código de Hamurabi, também, mas vamos ficar em algo mais recente, na Lei das XII Tábuas romana rs. Bem, nessa vetusta Lei, de mais de 2.450 anos, a primeira Lei dos romanos, a Posse e a Propriedade estão disciplinadas na Tábua VI, In Verbis: Do Direito de Propriedade e da Posse. A propriedade e a posse estão disciplinadas em nove artigos, sendo dois deles, destinados ao direito de propriedade sobre as... Mulheres!rs Eu digo e não acreditam, então, vamos lá, aos artigos rs:


                                      TÁBUA VI 

             Do Direito de Propriedade e da Posse. 

(...)


VI. A mulher que residir durante um ano em casa de homem, como se fora sua esposa, será adquirida por esse homem e cairá sob seu poder, salvo se se ausentar da casa por três noites.


Comentário meu: Por que há mulheres que são milenarmente tão insubalternizáveis?rs O que que essa criatura tinha que fazer fora de casa durante três noites?rs Deixar de cair sob o poder de um amo e senhor seu marido, podendo passar a ser adquirida como uma "coisa" dele por besteira? Como é que uma mulher abre mão, tão facilmente, de  tão alto privilégio de ser propriedade de um homem?


IX. Se alguém quer repudiar a sua mulher, que apresente as razões desse repúdio.


Comentário meu: Ser propriedade de um homem era mesmo uma situação de privilégio para as mulheres. Não havia possibilidade de vida sem estar à sombra de um falo. O falo sustentáculo do famulus, já que família vem do latim famulus que significa "ser servo, estar sob um poder". Logo, uma mulher deixar de ser propriedade de um homem e sair do poder de uma família era a sua derrocada fatal, sua lamentável condição de infortúnio. Portanto, mister falo, para tanto, apresente fundamentadamente as razões desse execrável repúdio! 


Francamente, eu não dava nunca pra ter nascido em Roma...


segunda-feira, 28 de março de 2022





 Minha reação instintual: BEM-FEITO!!!!


MINHA REAÇÃO RACIONAL:


Já não há quaisquer controvérsias acerca da nocividade e eventual ilicitude de piadas que envolvam a dignidade humana de uma pessoa quanto à sua raça, etnia, origem e sexualidade, por que então resta quaisquer dúvidas quando se trata da dignidade de uma mulher e o cerne da agressão (sim, houve agressão!) é uma doença sofrida pela mesma e que envolve a sua imagem naquilo que  simboliza a máxima expressão de sua feminilidade: os seus cabelos?


O limite da piada são os direitos da personalidade, ainda mais quando se trata de uma doença sofrida pela vítima. O marido agiu em nome dos direitos de terceiro. E, claro, não caberia um tapa, mas, com certeza o ajuizamento de ação de responsabilidade civil com indenização por perdas e danos morais e materiais. 


E, impressionante como a Academia de Cinema, ao se pronunciar sobre o tema, enfatizou que não tolera agressão física, mas se omitiu acerca de agressões morais.


Enquanto houver a banalização das agressões morais contra a dignidade da pessoa humana e os seus direitos da personalidade as quais eu denomino de vilipêndio espiritual, a vingança privada será recorrente. Com a Justiça  sendo feita, literalmente, de mão própria.

 E PORQUE SEGUIMOS NO MÊS DA MULHER:


O CONFINAMENTO E O CLAUSTRO COMO POSSIBILIDADE DE LIBERTAÇÃO. 


SIM, SER FREIRA PODE SER UMA POSSIBILIDADE DE SUBVERSÃO




Diversamente do que narra o discurso e o pensamento corrente, a opção tida, muitas vezes como residual de adentrar os impermeáveis muros de um claustro, poderia ser, ao invés, a possibilidade de uma vida de maior porosidade com o mundo para as mulheres. Durante séculos e porque não dizer, milênios, a existência feminina circunscrevia-se ao espaço da intimidade, da prisão doméstica. Apenas às mulheres consideradas "públicas" ou que não eram "de família", geralmente, órfãs, filhas bastardas de imigrantes e aventureiros é que poderiam caminhar livremente sobre o chão da vida. 


Às demais, "privilegiadas" e contempladas por estarem inseridas no jogo patrimonial do modelo patriarcal, cabia, restritivamente, estarem sob o látego paterno e deste transitarem para o látego do marido. E bem responderem  às suas funções de reprodutoras e cuidadoras do lar, assujeitadas às ordens do "chefe" da família. Poucas tinham acesso à cultura e à educação. 


O mesmo não se dava com as freiras. Desagrilhoadas da lógica de poder masculina, viviam em irmandade com outras mulheres (e não que nessas irmandades não houvesse opressão no exercício do poder, mas, ao menos, era poder feminino). Nelas, eram facultadas à leitura, ao estudo, à vida intelectual e à prática das artes. A partir delas, a não ser naquelas que até hoje, pouco permitem as incursões para o mundo, tal como a Ordem Carmelita, poder-se-ia transitar, não apenas para as praças e os rincões de suas comunidades, mas para sítios distantes como atividade integrante de suas "missões". 


No Brasil Colônia, por exemplo, as freiras muito rezavam, assim como as demais mulheres. Mas, também, muito cantavam e mais ainda: dançavam! E dançavam danças que jamais seriam permitidas àquelas que tiveram a "sorte" de bem casarem e procriarem. As freiras no Brasil Colônia dançavam o lundu! Dança tida por lasciva e luxuriosa coreografada pelos escravos... E assim, ser freira, poderia representar, mais do que apenas um caminho residual daquelas que estavam perdidas (desvirginadas) ou não haviam conseguido um casamento, ou das que estavam destinadas a oferecer um status de respeitabilidade às suas famílias. Ser freira poderia representar uma carta de alforria do regime de escravidão ao qual estavam submetidas as mulheres no patriarcado...

 A aprovação da PEC das DOMÉSTICAS teve forte IMPACTO nas RELAÇÕES de GÊNERO. 



Há um mito de que as mulheres brasileiras seriam esposas mais dóceis e submissas do que as alemãs, por exemplo, quando o que ocorre é  que a presença da empregada doméstica impede o enfrentamento direto entre homens e mulheres no que tange às tarefas domésticas. Com a aprovação da PEC e a natural diminuição d acontratação desses funcionários que tenderão a migrar para outras áreas, tendo as mulheres avançado muito na conquista do espaço público, ficando bem pouco em casa, as relações entre homens e mulheres dentro do lar tendem a ser mais IGUALITÁRIAS. Caso isso não aconteça, os homens, provavelmente deixarão de sentir o gosto doce, para sentir o gosto amargo da mulher brasileira.

domingo, 27 de março de 2022

 Bom domingo sob os acordes de CLARA SCHUMANN!


"No passado acreditava que possuísse talento criativo, mas desisti dessa ideia; uma mulher não deve desejar compor - até hoje nenhuma foi capaz de fazê-lo. Eu deveria esperar ser essa mulher?". Clara Schumann


Clara Schumann, esposa do famoso compositor Robert Schumann, foi uma criança prodígio, dando o seu primeiro recital público em Leipzig quando contava tenros nove anos de idade. Apresentou-se pela Europa, acompanhada pelo pai, um renomado professor de piano, entre 1831 e 1835, enquanto, também, compunha proficuamente. Já era reconhecida como uma virtuose na França e na Alemanha quando Schumann, aluno do pai dela, começou a cortejá-la. 


Mesmo com resistências de seu pai, Clara e Robert casaram-se na Corte de Apelações de Leipzig quando ela completou 21 anos de idade. Dedicou a sua vida na divulgação das composições de seu marido, mas foi desautorizando-se pouco a pouco a ser reconhecida, também, como uma grande compositora. 


E você, já desautorizou a si mesma e aos seus talentos pelo fato de viver em um mundo pródigo em desautorizar as pessoas pelo simples fato de serem mulheres?




sábado, 26 de março de 2022

 SER BONITA, GOSTOSA (E ATÉ FÚTIL) TAMBÉM É UM DIREITO






Há questões debatidas no feminismo cujos posicionamentos podem levar a uma nova dinâmica de frustração para as mulheres. Uma delas diz respeito ao padrão de mulher atraente. 

Eu já começaria por interrogar se quem critica o dever de ser atraente, em verdade está por demais preocupada em ser atraente. a descontruir esse “dever de ser atrativa”, pois se as mulheres execram os padrões de atração é porque querem ser atrativas fora dos padrões, quando o primeiro passo para essa libertação é, simplesmente não fazer questão de ser atrativa. Mas como a regra humana é a vaidade, continuemos levando-a em consideração. As mulheres intelectuais insistem que o padrão de mulher deve migrar do padrão da mulher bonita e gostosa para o padrão da mulher intelectual e especialista. Ora, em um país onde em torno de 11% da população consegue concluir a Universidade, infiro que é mais fácil alguém se tornar bonita e gostosa do que se tornar uma profissional intelectualizada. Ainda mais se tratarmos de uma grande parte das mulheres brasileiras que são aquelas que vivem nas periferias, das classes baixas , médias baixas e até médias. São geralmente essas que, ao serem brindadas com alguma beleza, podem ficar bonitas e gostosas e desfilarem os seus atributos físicos, seja em escolas de samba, revistas masculinas e congêneres. O que diremos a  elas? Vista a sua roupa, vá estudar naquela escola pública de sua periferia, cheia de marginais e reze pra ter almoço amanhã, porque você está causando frustração nas mulheres que não têm um corpo tão belo quanto o seu? Vá ser uma intelectual (isso sim, talvez um padrão inatingível nesses casos)? Não sou a favor da coisificação da mulher, não importa quem seja ela, até se for uma atriz pornô. Mas sustento que o debate em torno da opressão sofrida historicamente pela mulher deve ter como alicerce a busca pela felicidade de TODAS e não a inveja e a competição. A mulher que vive em função de seu corpo e de sua beleza, por ser bonita e gostosa tem DIGNIDADE e merece RESPEITO. Não sou a favor de nenhum padrão, quer seja o da beleza, quer seja o da intectualização. Quebremos os grilhões do escravagismo! Afinal “CADA UM SABE A DOR E A ALEGRIA DE SER O QUE É”.

 A DAMA E O VAGABUNDO DE PLANALTINA- "Ei, moço, moço! Quer 'namorar' comigo?"

Reflexões para além de surtos psicóticos e abusos sexuais.


Nesta semana um fato inusitado envolvendo uma bela mulher casada e um morador em situação de rua chamou a atenção de todas as mídias. Eis que uma missionária benfeitora de uma Igreja Evangélica, envolvida em projetos de assistência e doações a moradores em situação de rua decidiu por doar a própria carne em comunhão a um desassistido. 


O momento dadivoso teria sumido na poeira da história se o seu marido, um portentoso personal trainer, não houvesse flagrado o ato em plena sagração já que a moça afirmou que naquele instante da comunhão, digno da hóstia de seu propósito, havia visto a imagem de Deus. Em estado de choque e descontrole diante da cena (ou milagre?) que testemunhara, o marido assomou-se para dentro do carro da esposa onde tudo acontecia, arrancou o morador em situação de rua de dentro do automóvel e o espancou furiosamente. Sendo tudo devidamente filmado pelas câmeras onipresentes na atual sociedade da vigilância. 


O evento epifânico levou o marido da missionária e os amantes de ocasião a redutos-limite da transgressão: todos, para as  barras da polícia judiciária, a religiosa, para um leito de hospital psiquiátrico.


Ao refletir sobre o tema, pude, mais uma vez, constatar o quanto o sexo derruba as barreiras das desigualdades sociais e econômicas, sendo essa moça, antes de tudo, um arauto na luta pela Igualdade em todos os níveis e instâncias. E o quanto essa espécie de prática erótica entre pessoas antípodas   está longe de ser excepcional e, muito pelo contrário, é comum e corriqueira, quando a mulher está em situação de vulnerabilidade e, até mesmo, precariedade, e o homem ocupa uma posição social mais favorecida, ainda que esses encontros geralmente se dêem em virtude de um exercício de poder por parte dos homens. Esse fato envolvendo uma bela mulher branca das classes médias e um homem em estado de mendicância, uma aberração que tão somente poderia justificar-se como um estupro por parte do morador de rua ou um surto psicótico por parte da moça benfeitora, quando a mulher e o homem trocam de lugar,  é estruturante nas relações de gênero de nossa sociedade, ao menos, a brasileira, desde os seus primórdios. 


Ou não era corrente os assaltos dos homens brancos e proprietários sobre mulheres escravizadas, e, depois, sobre toda e qualquer mulher em situação de subalternização?


Enquanto às mulheres sempre coube se relacionarem com homens de seu mesmo estrato social ou superior, sendo inimaginável uma mulher se unir amorosamente ou sexualmente com um homem de situação econômica inferior, ainda mais, muitíssimo inferior, aos homens sempre foi permitido e até mesmo incentivado esse trânsito a transpor todas as barreiras de raça e de classe econômica e social através da carne. 


Da perda da virgindade com a empregada da casa familiar aos costumeiros programas com prostitutas quando já casados. E não apenas com prostitutas de melhor trato, as garotas de programa, mas com aquelas que são moradoras em situação de rua. No caso da cidade do Recife, também, com aquelas que são moradoras "em situação de mangue" e que servem aos homens cerca de vinte vezes por dia a fim de se servirem de um único prato de comida, temperado a drogas, ao final de seus "expedientes".


No meu caminho diário para a Universidade, à luz do sol, estou cansada de ver mulheres em condição de rua, em andrajos, aos farrapos, adentrarem os carros de homens bem alimentados e corados,  muitos,  provavelmente, casados, para fins de comunhão carnal. E nunca ouvi falar que, para fazê-lo, esses homens estariam tendo um surto psicótico.


E aqui chego ao ponto que gostaria de acentuar nessa reflexão: O desejo feminino. 


Sim. As mulheres, a despeito de todos os grilhões e condicionamentos sexuais, desejam. E muito. E são capazes de desejarem a despeito de raça, credo e condição financeira e social, diversamente do que "quer" a cultura. Do que pretende a cultura machista e patriarcal. E não cessam de desejar por serem casadas, assim como os homens. E não desejam outros homens por seus homens não lhes satisfazerem, assim como os homens. E tomam as rédeas na direção de seus desejos, assim como os homens.


E, no mais das vezes, desejam, não para exercício de poder e subjugação, mas por simples dádiva e prazer, o que pode ter acontecido com a Dama e o Vagabundo de Planaltina. Diversamente dos homens...



sábado, 19 de março de 2022

 QUAL O PAPEL DA ACADEMIA NA LUTA PELA EQUIDADE DE GÊNERO?


A Academia  tem um papel primacial na construção do discurso feminista. Historicamente, foi é é na Academia que o feminismo é forjado, fecundado e irradia-se para as ruas.  Sendo que, não poucas vezes, são as acadêmicas, as protagonistas do movimento extra-muros das  Universidades. Isso desde Simone de Beauvoir, passando por Luce Irigaray até chegar a Judith Butler, dentre centenas de outras filósofas, sociólogas, psicólogas, antropólogas e juristas. Isso faz do feminismo um dos mais científicos dos movimentos pela equidade.

Não foi sem razão que o historiador Eric Hobsbawn afirmou que o feminismo havia sido o movimento mais importante e desestruturador do séc. XX. Isso não seria possível se o seu discurso não fosse fundamentado em estudos e pesquisas de metodologias rigorosas, comprometidas, antes de tudo, com a ética. 

O papel da acadêmica feminista é olhar, com a máxima agudeza que lhe for possível, a tessitura da malha social, a sua construção e as suas relações de força e poder. É, mais do que dar as melhores respostas, fazer as melhores perguntas. Não apenas capacitar-se a visualizar criticamente o mapa da violência de gênero, mas, ao narrá-las, destrinchá-las e propor novas práticas de atuação e de possibilidades de resistência. 

Enfim, o papel da Academia para o feminismo é um papel matriz, de pesquisa, denúncia, protagonismo, divulgação de conhecimento e informação, propiciando a toda a sociedade uma real possibilidade de transformação. 

Nas fotos abaixo, estou com a querida amiga, colega e companheira feminista, a Professora Carolina Ferraz, em palestra na Procuradoria da República, MPF-PE, sobre Cultura do Estupro e Assédio Sexual e Assédio Moral (Antes da pandemia).

Professoras e Pesquisadoras: Avante!!!! Alunas: Venham!!!!







sexta-feira, 11 de março de 2022

Revolução Pernambucana

 A REVOLUÇÃO PERNAMBUCANA E A CAPACIDADE BRASILEIRA DE TRANSFORMAÇÃO. 

(Ou sobre a ideologia da inutilidade das sublevações no Brasil)



A data Magna que passou a ser comemorada a cada dia 06 de março no Estado de Pernambuco em razão da Revolução Pernambucana nos leva a muito refletirmos  sobre nós mesmos, pernambucanos, e sobre todo o povo brasileiro em sua capacidade de levar a cabo ações e práticas transmutadoras. 


Primeiro, ao questionarmos a invisibilidade histórica dessa revolução de modo a incutir no povo brasileiro um sentimento eterno de constitutivos derrotismo e incompetência revolucionária. Como se em nós houvesse, intrinsecamente, uma incapacidade para a promoção de mudanças efetivas. Os livros de história se esforçaram para nos convencer desse espírito nacional de não vocacionados para as transformações estruturais e mudanças de status quo há séculos. Entendamos.


O movimento brasileiro que consta como sendo a mais significativa revolução iluminista e libertária em nossos  livros de história, sendo inclusive razão de um feriado nacional, é a Inconfidência Mineira. Com todo o respeito a esse movimento e aos inconfidentes, o que ocorre é que a Inconfidência Mineira sequer foi uma revolução ou um movimento efetivo. Foi, ao invés, tão somente, uma ideia, um plano que não foi concretizado. Tendo sido os seus mártires, condenados à morte,  não por terem realizado a revolução, mas, estritamente, por seus atos preparatórios. O mais homenageado deles, Tiradentes, não tem, sequer, existência certa. Ou seja, no dia 21 de abril comemoramos uma Revolução ABORTADA, sequer não vitoriosa, já que apenas uma TENTATIVA de Revolução!. 


O que me indago é se o propósito dessa data é comemorar a "Inconfidência", o projeto de revolução, ou o seu abortamento. Como se fosse uma data feita para nos lembrarmos de nossa incapacidade de implementar projetos de mudança e que, ao tentamos assim fazê-lo, teremos sempre a nossa morte anunciada ainda no período gestacional. Logo, a invisibilidade da Revolução Pernambucana frente à Inconfidência Mineira não se trata, tão somente, de fazer prevalecer os fatos históricos-políticos ocorridos nas regiões Centro-Sul sobre os fatos históricos-políticos ocorridos nas regiões Norte-Nordeste. Trata-se de uma evidente mensagem de DESENCORAJAMENTO transmitida pelas instâncias máximas de poder político a TODO o povo brasileiro. Uma ideologia centenária sobre a inutilidade de nossas sublevações e tentativas de mudanças estruturais. Ainda mais em se tratando de movimentos separatistas. Afinal, no dia 21 de abril comemoramos a nossa derrota o que seria o oposto se a Revolução libertária que comemorássemos anualmente fosse, ao menos, também, a Revolução Pernambucana!


Sim, porque a Revolução Pernambucana foi VITORIOSA! Foi um movimento ILUMINISTA e LIBERAL, um braço da então recente REVOLUÇÃO FRANCESA, eclodindo na América do Sul e capitaneada por brasileiros, homens da terra. Em 1817, derrotamos o PODER CENTRAL, colocamos abaixo a MONARQUIA e proclamamos uma REPÚBLICA! É, originariamente, não do Estado de Pernambuco, mas da República de Pernambuco, a nossa bandeira! Tivemos representação diplomática no exterior. No caso, o Embaixador Cruz Cabugá nos Estados Unidos da América. Durante mais de dois meses fomos uma República independente e vencedora. Mas esse fato histórico deve ser silenciado, afinal, não diz respeito a comemorarmos a nossa derrota e o nosso destino incontornável de  derrotados em nossos projetos de mudança. Diz respeito a comemorarmos a nossa VITÓRIA e a nossa potência transformadora, proclamada não por um português como ocorre na celebração da independência do país, mas, independência proclamada pelo povo brasileiro!


A Revolução Pernambucana não era comemorada em nosso próprio Estado. Passou a ser celebrada, recentemente, a partir de 2008 e só no ano de 2017 tornou-se dia feriado. Trata-se de Revolução ainda desconhecida pela maioria esmagadora de nossa população.  A hipótese que ora advogo é a de que  o seu total desconhecimento em âmbito local e nacional tem o condão proposital de perpetuar o sentimento de eterna pequenez e insignificância do povo brasileiro. O sentimento de inutilidade de nossas práticas de mudança. Mais ainda no que diz respeito às mudanças na estrutura do poder. Acostumamo-nos a sermos elefantes gigantes que desconhecem totalmente o próprio peso e vivem como se tivessem o peso de uma minhoca! A nossa cidade do Recife, cidade de raiz mercantil, libertária, vocacionada para a circulação de riquezas com maravilhosos portos, seria para ser, no mínimo, algo próximo à cidade de Roterdã! Assim como cada cidade brasileira e respectivas vocações! Vivem todas muito aquém do que realmente poderiam ser!


Mas, sigamos, é hora de revermos a nossa história e os seus discursos  inferiorizadores; incapacitantes, despotencializadores, perversos e traumáticos.


Vamos pôr abaixo, um a um, os nossos complexos, inclusive aquele que nos coloca em total dependência e subalternização ao pai-Estado e que nos leva à eterna nostalgia de um Rei. 


Sejamos o que realmente somos! Transformadores, potentes, capazes e RICOS!


O brasileiro, junto a sua história tem sido morto a cada dia. Mas, já está mais do que na hora de proclamarmos a nossa potência transformadora, a nossa força vital, que assim como o Estado de Pernambuco é  IMORTAL.

quinta-feira, 10 de março de 2022

Semana da Mulher em 2021

 PANDEMIA DAS SOMBRAS - SEMANA DA MULHER NO ANO DE 2021


A Semana da Mulher no ano de 2021 foi a mais triste desde a sua instituição. Igual ou pior do que o foi durante as duas Grandes Guerras Mundiais. Se em 2019, 243 milhões de mulheres e adolescentes sofreram violência doméstica ao redor do mundo, em 2020 esse número, no mínimo, triplicou. 


São as mulheres que mantêm o mundo girando durante a Pandemia do Coronavírus. São elas o número massivo de enfermeiras, técnicas de enfermagem, médicas e profissionais de limpeza que estão na linha de frente na recepção, no acolhimento e no tratamento dos doentes. 


São as mulheres que estão na linha de frente nos espaços domésticos em cada país ao redor do globo nos quais somamos mais de dois bilhões de confinados. Nesses espaços são elas em acachapante maioria que cozinham, limpam, lavam, cuidam dos filhos também confinados e os educam extra e institucionalmente, já que passaram a ser dublés de professoras e coordenadoras de escolas. 


São as mulheres que se tornaram as cuidadoras permanentes e, em menos de um ano com máxima especialização, não apenas de suas famílias nucleares, mas de seus idosos e deficientes mais próximos e distantes.


E são essas mesmas mulheres que estão sofrendo violências domésticas e sexuais a um só tempo, por todo o planeta em uma magnitude jamais vista: Agressões físicas, psicológicas, patrimoniais... A cada dia, uma multitude de mulheres está sendo assassinada. As vítimas dessas violências superam em números, as vítimas do coronavírus. Vivemos o que a ONU Mulheres chamou de PANDEMIA DAS SOMBRAS.


Em meio à uma Peste, a uma crise sanitária, a uma hecatombe, a uma doença mortífera cujo principal sintoma é o comprometimento das vias respiratórias. Ao menos nessa Semana da Mulher, indague à mulher mais próxima, àquela que está ao seu lado: "VOCÊ ESTÁ CONSEGUINDO RESPIRAR?".

quarta-feira, 9 de março de 2022

ALEXANDRA KOLLONTAI

ENTRE A CONQUISTA DE DIREITOS E AS "NECESSIDADES MATERIAIS"

REFLEXÕES A PARTIR DO CASO DE ALEXANDRA KOLLONTAI






Em 2017 comemorou-se o centenário de uma revolução crucial: A Revolução Russa de 1917. Falarmos sobre a Revolução Russa não significa fazermos apologia do comunismo ou de quaisquer ideologias governamentais, mas falarmos sobre lutas por direitos que têm sido encetadas pelas minorias no decorrer do séc. XX e que encontraram e encontram dificuldades em serem consolidados nos mais diversos regimes políticos, inclusive no próprio comunismo. 

Em se tratando de lutas de gênero, escolho aqui, fazer uma homenagem à Revolução Russa através da imensa feminista, ALEXANDRA KOLLONTAI. Alexandra, nascida em berço oligárquico-latifundiário, abandonou suas origens nobiliárquicas e agregou-se à luta dos trabalhadores, tendo sido uma intelectual autodidata, uma vez que lhe fora cerceado o direito à plena educação. Foi ativíssima militante comunista durante toda a sua vida, havendo integrado o grupo que lutou e conseguiu, logo após a Revolução Russa de fevereiro e outubro de 1917, a decretação das seguintes Leis, já em 1920: Descriminalização do aborto em quaisquer circunstâncias, divórcio e a possibilidade de uniões erótico-afetivas livres. 

A Rússia foi o primeiro país do mundo a descriminalizar o aborto em 1920. Em razão de problemas econômicos e em decorrência da pressão da ala mais conservadora dos bolcheviques, esses direitos passaram por mitigações, chegando Alexandra a sofrer um "exílio branco" ao ser enviada para fora da Rússia em "missão diplomática". Com a ascensão de Stálin, esses direitos foram mais e mais desafiados e houve um franco retrocesso em muitas conquistas das mulheres. Militante do Direito e do Amor, Alexandra, dentre outros livros, escreveu a "Autobiografia de uma Militante Comunista Sexualmente Emancipada". 

Todos esses fatos têm muito a nos ensinar e nos leva a fazermo-nos, principalmente, as seguintes indagações: O quanto as liberdades e os direitos podem ser cerceados em nome de alegadas conquistas econômico-materiais? O quanto essa contradição existe, de fato? O quanto ao ser essa escolha lançada como uma "Escolha de Sofia", existe subjacente à essa dicotomia uma verdade mais profunda que é mascarada por essa binariedade, tal como uma irresponsabilidade quanto à elaboração de políticas públicas que preservem os direitos e as liberdades alcançadas?

 Isso é urgente, não apenas para entendermos o que ocorreu após a Revolução Russa quanto aos direitos sociais e das minorias originalmente conquistados, mas para, principalmente, entendermos e nos questionarmos sobre a procedência atual em abrirmos mãos de conquistas sociais e de direitos individuais em nome de uma eventual "necessidade material". Não se trata de alçarmos a bandeira vermelha, mas de assumirmos que o nosso sangue é vermelho e o quanto estamos dispostas e dispostos a oferecê-lo em sacrifício do que nos esmaga e nos oferece em troca, tão somente, a face exangue da palidez.

DEUSA PRA CASAR PUTA PRA TREPAR

 DEUSA PRA CASAR, PUTA PRA TREPAR





DEUSA PRA CASAR, PUTA PRA TREPAR

Sem retirar uma vírgula de toda indignação nacional e internacional em torno dos áudios vazados de um ora quase-não parlamentar, ao assistir, ontem, a um outro vídeo no qual um motorista de ônibus do Paraná disse que iria fazer horas extras a fim de conseguir casar-se com pelo menos duas ucranianas, em razão do qual foi demitido da companhia de transportes, pude constatar de forma veemente e incontroversa o preconceito e a misoginia nacional e internacional CONTRA A MULHER BRASILEIRA.

Em ambos os casos que geraram comoção, tendo o primeiro dado azo a editoriais nos principais periódicos internacionais e o segundo ensejado a demissão do motorista, os agressores afirmam e reafirmam que as ucranianas são DEUSAS e que desejariam CASAREM-SE com elas a fim de fazerem o que elas bem quisessem e muito mais por toda a vida. O que causou maior repúdio na fala do primeiro foi afirmar que "as ucranianas são fáceis porque são pobres", afirmação, inexoravelmente, deplorável, pois mesmo que a Ucrânia seja considerada um dos países mais pobres da Europa, o que não torna as suas mulheres "fáceis", há o agravante de o indigitado se referir a mulheres que estão vitimizadas por uma Guerra. 

Em um vídeo que circula na Internet, gravado por uma ucraniana que já viveu no Brasil, a bela moça, ao expressar toda a sua revolta com o fato, não sem deixar de agradecer ser chamada de Deusa, afinal as ucranianas são deusas mesmo,  não deixa de citar a condição de miserabilidade das "faveladas brasileiras", portanto mais pobres do que elas. 

Se um brasileiro fez a infame afirmação de que as ucranianas são fáceis porque são pobres e chamar um povo europeu de pobre, ainda mais sendo um latinoamericano, talvez seja mais indigesto do que chamar alguma mulher europeia de fácil, desde que o território brasileiro foi invadido pelos europeus, as mulheres brasileiras são chamadas de lúbricas, devassas, e pior do que fáceis, já que para ser fácil é preciso ser antes assediada: Oferecidas.

Uma vez que esta condição de "oferecidas" partiu de um estigma que recaiu, inicialmente, sobre as índias e as escravas negras (não sobre as brancas europeias que para aqui vieram, é claro), com a miscigenação, ser fácil, ser pobre e ser prostituta passou a ser a imagem da brasileira que corre o mundo e é alardeada em todos os hemisférios. E muito mais do que causar indignação, essa fama difamatória foi ostensivamente capitalizada pelas políticas de Estado Brasileiro, acentuadamente durante os governos militares, sendo, então, as brasileiras oferecidas pela própria Embratur no mercado internacional como uma "commodity". 

Enquanto os brasileiros pretendem mais arduamente trabalharem para com uma branca europeia se casarem, os europeus desde sempre pretenderam apenas  juntar mais  algumas moedas para com as brasileiras se lambuzarem e, depois, as descartarem. 

Sim, prendam (o que é de justiça) os homens que afirmam que as ucranianas do primeiro mundo são fáceis porque são pobres, assim como prendam por todo o planeta, os homens que dizem que as brasileiras são  prostitutas porque são faveladas do terceiro mundo. 

Afinal, Deusa Branca é pra Casar, Puta Brasileira é pra Trepar.








terça-feira, 8 de março de 2022

A Desigualdade não é Doce nem é Rosa


 

 POR QUE TERMOS MULHERES NO PARLAMENTO É TÃO IMPORTANTE?


A cada eleição os reclames acerca da participação das MULHERES na POLÍTICA se alastram sob os argumentos da importância da igualdade numérica na ocupação das cadeiras em nossas Câmaras Municipal, Estadual e Federal.


Neste Dia da Mulher, chamarei as suas atenções para o fato de que termos mulheres LEGISLADORAS não atende tão somente a um equilíbrio de gênero, a um preenchimento de "cotas", mas a um pressuposto essencial para que conquistemos direitos e avancemos na luta pela dignidade feminina. A maioria das leis que tratam sobre matéria que diga respeito à educação, saúde, segurança e enfrentamento à violência contra as mulheres foram propostas por MULHERES! 


Durante esta Semana da Mulher, trarei alguns desses exemplos a se iniciar pela atual vereadora, ex-Deputada Federal por São Paulo IARA BERNARDI.


Vejamos algumas das mais importantes conquistas que alcançamos  através de seu trabalho no Parlamento:


2001 - Autora do Projeto de Lei que criminalizou o ASSÉDIO SEXUAL.


2004 - Autora do Projeto de Lei que criminalizou a VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, passando esta a ser tipificada em nosso Código Penal.


2005 - Autora do Projeto de Lei que levou à reforma do Código Penal, cujas importantes medidas foram:


1) Extirpar o qualificativo "MULHER HONESTA".


2) Extirpar o CASAMENTO DO  ESTUPRADOR COM A VÍTIMA do estupro como hipótese de extinção da punibilidade do estuprador.


3) Revogar o CRIME DE ADULTÉRIO, que apenas criminalizava as mulheres e não os homens.


4) A criminalização do ESTUPRO MARITAL. 


Neste DIA DA MULHER que demos VIVAS a IARA BERNARDI e às LEGISLADORAS de nosso País!!!!




 Sempre que me perguntam: "POR QUE AVANÇA TÃO ASSOMBROSAMENTE A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO BRASIL E NO MUNDO?", a minha resposta é sempre curta e rápida: "PORQUE ESTAMOS ALCANÇANDO O PODER". Ato contínuo, me perguntam: "E POR QUE JÁ EXISTIA A VIOLÊNCIA  ANTIGAMENTE?", a resposta me vem ainda mais fácil: "PARA QUE SEQUER COGITÁSSEMOS ALCANÇAR O PODER". 


Sim, estamos alcançando o poder. Há muito, ainda, por óbvio, a conquistar, os desafios e obstáculos são inumeráveis mas não suficientes para nos deter.


Trago aqui apenas alguns números que são sobremaneira significativos e revelam que estamos escalando o poder econômico, político e social com a força de um tsunami:


As mulheres são maioria no ensino médio em 73% dos municípios brasileiros, sendo a maioria dos estudantes em todas as capitais do país;


As mulheres progridem mais do que os homens na educação, sendo delas o maior número de concluintes em todos os seus graus;


Nos cursos de nível superior, o número de mulheres representa 62,9% do total de concluintes de todo o Brasil;


Pesquisa feita pela Faculdade de Medicina da USP aponta que o número de mulheres que entram nos cursos de medicina em todo o país é superior ao número de homens desde 2009, sendo que as médicas são a maioria dentre os profissionais com idade inferior a 29 anos;


Na faixa que vai até os 25 anos de idade, as mulheres representam a maioria (64%) dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB);


As mulheres também são a maioria dentre aqueles que exercem a arquitetura no Brasil (63, 10%), sendo que em apenas dois estados brasileiros, a maioria é de arquitetos;


O número de mulheres brasileiras que concluem os seus cursos de doutorado no exterior já ultrapassou o número de homens;


Atualmente, as mulheres ocupam 69% dos cargos de Liderança em Comunicação no Brasil;


Na política ainda há muito a conquistar. Em sendo o centro nevrálgico do poder, de onde partem as leis que promovem a igualdade, a luta é desafiadora e renhida. Mas as experiências além de nossas fronteiras nos mostram, sim, que os obstáculos poderão vir a ser debelados.  Em países como Ruanda e Andorra, as mulheres já são a maioria no parlamento. Ainda nessa esfera da vida pública, um estudo publicado pelo Journal of Economic Behavior & Organization apontou que a corrupção é menor nos países nos quais as mulheres têm maior participação no governo. Vamos então, firmes, devagar e sempre, firmes, devagar e sempre...


Se as mulheres são maioria esmagadora em profissões relacionadas às áreas das ciências  humanas, mesmo, nas ciências ditas "duras", aquelas matematizadas, o número de mulheres exercendo profissões como a de engenheira, disparou no país. Números  do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), revelam que a participação das mulheres nas áreas de exatas recrudesceu, aceleradamente, de 2011 até 2016. Os dados do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) confirmam que o número de mulheres engenheiras registradas, por ano, no sistema passou de 13.772, em 2016, para 19.585, em 2018, um crescimento de nada menos do que 42%!  Ainda, de acordo com o Confea, o número total de engenheiras ativas no Brasil, hoje, é de 196.372. Se, antes, as mulheres apareciam timidamente nas salas de aula voltadas às tecnologias, hoje, as suas presenças pululam e a cada dia é mais expressiva a ocupação de mulheres em cargos de liderança no setor.


No empreendedorismo, o número de mulheres tem crescido aos galopes. Segundo estudo conduzido pelo SEBRAE, no ano de 2017 computaram-se 24 milhões de empresárias contra 25 milhões de empresários, uma diferença tida como pequena para o setor. A ainda melhor nova é que, nos novos negócios, as mulheres superam os homens em quase um ponto percentual, sendo um total de 14, 2 milhões de microempresárias no Brasil. A mulher empresária revela um maior compromisso social, sendo que os negócios ligados à saúde, aos serviços sociais e à educação são, em sua maioria, empreendimentos femininos.  A cada dia 19 de novembro, comemora-se o Dia Mundial do Empreendedorismo Feminino e as brasileiras afirmam que, apesar das adversidades, têm muito a comemorar, uma vez que, além de serem líderes da metade das corporações nacionais, as mulheres empreendedoras têm se mostrado mais ousadas do que os homens empreendedores, já que a inovação está presente nos negócios femininos em cinco pontos percentuais a mais. 


 E o número de famílias comandadas por mulheres deu um salto de 105% de 2001 a 2015 no Brasil! E não estou falando, apenas, de mulheres que criam seus filhos sozinhas sem a contribuição dos ex-companheiros. Nas famílias nas quais há marido e filhos, a chefia feminina subiu 551%! De 1 milhão em 2001 para 7 milhões em 2015! E nas famílias de casais sem filhos, aí que as mulheres se tornaram mesmo as poderosas chefonas das famílias. Nessa última situação, o aumento das mulheres como maiores responsáveis pelo sustento econômico do lar, tornando-se as "chefas" da família teve um salto de 822%! Atualmente, 40% dos lares brasileiros têm as mulheres como seus líderes econômicos e financeiros.


E como para as mulheres nem o céu é o limite, O número de mulheres no comando de uma aeronave no Brasil teve um aumento de 106 pontos percentuais no exíguo "espaço" de tempo de três anos, ou seja, de 2015 a 2018! Já se foi o tempo em que cabia à mulher só pilotar fogão!


Last but not least, mesmo nessa sanha de alguns por sermos exterminadas, existimos em maioria no país. No Brasil as mulheres são 51,7% da população, 52% do eleitorado e enquanto, hoje, a expectativa de vida dos homens é de 73 anos de idade, a das mulheres é de 80 anos.


Ou seja, a violência contra a mulher é proporcional ao incremento de nossas conquistas e é uma reação à desconstrução que temos feito aguerridamente nos núcleos de sustentação do patriarcado.


Mas sinto dizer: Não vai adiantar. Podem aqueles que não suportam dividir conosco o estatuto da igualdade e da solidariedade, continuarem como bestas-feras desatinadas, descompensadas e histéricas no desespero dos que temem conosco compartilhar o poder. 


Podem continuar a xingar-nos,a detratar-nos, a nos vir com palavreados chauvinistas e risinhos nervosos, a apontar-nos facas, a nos mirar com revólveres, a lançar-nos paus e pedras, a estuprar-nos, a denegrir-nos, a difamar-nos e a injuriar-nos. A nossa gana é irrefreável e, juntas, nos multiplicamos e representamos umas as outras.


Podem continuar. É inútil. Digerimos o fel inoculado pela violência transformando-o em sangue que borbulha em vitalidade e força.


Sinto muito, estamos, sim, alcançando o PODER. E preparem-se: Isso é só o começo.



domingo, 6 de março de 2022

O Falo do Mamãe Falei

 O FALO DO MAMÃE FALEI 


Não me causou nenhuma espécie e espanto  as infames e abomináveis falas do parlamentar edipiano vulgo "Mamãe Falo", ôps! "Mamãe Falei", uma vez que estão totalmente de acordo com os useiros e vezeiros discursos do MACHO PADRÃO BRASILEIRO, ainda mais daqueles que integram as elites econômicas ditas "conservadoras".


Não sei se por sorte ou azar, cresci ouvindo falas ainda mais agressivas e piores, pois creiam-me, as declarações do Mamãe Falei não são inexcedíveis no dicionário da cafajestagem, mas estão muito de acordo com o seu aporte pedagógico na caracterização do que seja um homem e como se deva falar um homem no Brasil, ainda mais dentre os seus pareceiros de escrotice. 


Não é sem coerência lógica que ao apresentar a sua defesa, o ainda parlamentar, um típico  macho padrão brasileiro, ao ser pego com a boca fazendo o que lhe é de costume, argumentou como principal e peremptório fundamento a justificar os seus impropérios, o fato de  "ser Homem". Ou seja, o fato inafastável e escusável de pensar, agir e sentir conforme dita e proclama  a cartilha do Macho Padrão Brasileiro.


Ou há algo de novo em nossos concidadãos explorarem sexualmente e afetivamente mulheres em situação de vulnerabilidade e pobreza? Não foi sempre assim desde a escravidão? Não é assim com as moças pretas, pardas, esbranquiçadas que vivem em favelas e diariamente e a cada instante tentam a todo custo sobreviver à miséria e fugirem da Guerra do Tráfico? Ou apenas nos comove a exploração sexual, ainda que apenas intencionada, contra as pobres e vulneráveis mulheres brancas, de olhos azuis e europeias, e não a realizada, a todo o tempo e secularmente, contra as mulheres em situação de precariedade em nossas periferias? 


Ou precisaremos sempre de uma Guerra no Leste europeu ou de uma Copa do Mundo como a da Rússia em 2018, nas quais os machos brasileiros escrotos não poderiam ter deixado de dizer a que tinham ido e onde as mulheres vítimas são "bucetas rosas", para nos indignarmos com as proverbiais práticas historicamente reiteradas dos play(bois) brasileiros?


Desde que as falas do Mamãe "Falo" vieram à tona, muitos homens, inclusive aqueles que têm a minha admiração e respeito, vieram à Ágora virtual e física, mostrarem as suas indignações diante das ignóbeis e machistas declarações de seu irmão de sexo. Rogo aos céus que essas indignações tenham brotado do mais profundo de suas almas e de suas honras e que não sejam simples declarações com as praxes do costume ou, ainda pior, meras conveniências políticas. Pois que, embora envernizados e mais contidos, da nossa cultura brasileira do cafajeste, poucos escapam. Que o digam os Esquerdomachos. É importante que neste momento, os homens brasileiros reflitam, se interroguem e se reconheçam ou não nas falas do indigitado parlamentar. 


Nessa história toda, o que mais me comove são as lágrimas das mulheres, sejam as da embaixatriz ucraniana, sejam as das jornalistas brancas, que demonstram vivo abalo ao narrarem o episódio, embora nunca as tenha visto derramarem uma só lágrima por nossas refugiadas internas, pardas e faveladas, ou, eventualmente, pelas empregadas domésticas de suas próprias casas quando exploradas e seviciadas pelos homens de suas famílias.

Mas, voltemos ao caso específico do parlamentar "Mamãe Falei". O que agrava a sua condição de cafajeste é, além de ter escalado a vida política como um arauto da moralidade e dos bons costumes, a possibilidade de ter ido cumprir a sua agenda de macho escroto em campo de guerra às custas do dinheiro público, o que deve ser investigado. Que o seu mandato, o seu falo e a sua fala sejam cortados. Pela espada da Lei.





 BRUXAS NO BRASIL


Em meio a uma história milenar na qual a violência contra a mulher é um dado constante e assombroso, é um refrigério termos acesso a narrativas que nos falam daquelas mulheres subversivas e transgressoras, dentre as quais as bruxas.


E não me refiro às bruxas idealizadas pela mitologia, mas às bruxas cujas práticas sempre desafiaram o status quo, a marginalização, as religiões e as ciências. Essas mulheres, por terem investido em forças e lógicas outras para a existência, foram cruelmente perseguidas a fim de serem exterminadas. Representavam um modo feminino de viver e de pensar que ameaçava a estrutura patriarcal do saber temporal e do saber espiritual. Estima-se que entre os séculos XV e XVIII, cerca de 100.000 mulheres foram executadas em fogueiras pela prática de bruxaria.


E essas sempre tiveram presença constante na história de formação do Brasil. Se formos falar das bruxas índias nativas, teremos material para um tratado. Mas, restringirei os meus exemplos ao nosso processo colonizatório inaugurado pelos europeus.


Falo das três feiticeiras que viviam na cidade de Salvador corria a década de 1590, antes dessa cidade receber a visita da Santa Inquisição como nos informa o historiador Emanuel Araújo.


Chamavam-se elas: Isabel Rodrigues, de alcunha "Boca Torta", degredada de Portugal para o Brasil em razão de suas práticas feiticeiras, Antônia Fernandes que dizia ter aprendido com o diabo que beber semente de homem fazia querer grande bem e Maria Gonçalves Cajado, de alcunha "Arde-lhe o Rabo". Essa última dizia:


"À meia-noite no meu quintal com a cabeça ao ar, com a porta aberta para o mar, eu enterro e desenterro umas botijas, e estou nua da cintura para cima e com os cabelos soltos, e falo com os diabos, e os chamo e estou com eles em muito perigo".


Chegamos até aqui, porque sempre, de algum modo, praticamos a transgressão, o enfrentamento e a resistência.


E porque sempre, sempre, desafiamos fogueiras com a força de nossa magia.




sábado, 5 de março de 2022

 BÁRBARA DE ALENCAR: AVÓ DE JOSÉ DE ALENCAR E HEROÍNA DA REVOLUÇÃO PERNAMBUCANA DE 1817.





O nosso grande escritor cearense José de Alencar foi um às ao empunhar sua pena e escrever sobre lutas, aventuras e enfrentamentos que forjaram a concertação étnica nacional, dando origem ao povo brasileiro. Teceu suas obras-primas albergado no recôndito confortável de seu lar. No dia 6 de março de cada ano comemora-se o aniversário da Revolução Pernambucana e uma das suas líderes que, de fato, empunhou armas, lutou contra exércitos, aventurou-se pelas terras nordestinas como perseguida política e desafiou o Estado Português e Dom Pedro I, foi a avó de José de Alencar, a cratense Bárbara de Alencar, personagem histórica e heroína daquela que foi a maior revolução do Brasil Colonial. 

Bárbara Pereira de Alencar, nascida na cidade de Exu e criada na cidade do Crato no Cariri cearense, integrava a elite agrária e latifundiária local. Com a eclosão do movimento separatista em Pernambuco que propugnava pela independência da região em face de Portugal e a instituição de um sistema republicano de governo, Bárbara de Alencar integrou-se ao mesmo, liderando o movimento na região do Cariri. Foi a primeira prisioneira política da história do Brasil, tendo morrido em fuga de perseguição política na cidade piauiense de Fronteiras em 1832. 

Foi sepultada em Campos Sales, cidade cearense. Por seu pedido teve um enterro simples, sepultada em uma rede como o eram os seus escravos. Ceci, Iracema, Lucíola, personagens de José de Alencar são belas representações da mulher brasileira idealizada. Mas, a melhor de todas as heroínas de Alencar, e a   mais fiel à  gana, à garra e à altivez da mulher brasileira foi uma mulher real, a sua própria avó, cuja vida heroica transborda para além das páginas de toda literatura.