“A
MULHER PERNAMBUCANA”
Andrea
Almeida Campos
(Professora
de Direito, advogada e escritora)
Palestra feita na tarde do dia 16 de dezembro de 2015, por ocasião da outorga da Medalha do Mérito
“Heroínas do Tejucupapo”, promovida pela OAB, seccional Pernambuco, às mulheres
pernambucanas que se sobressaíram em seus respectivos campos de atuação no ano
de 2014.
Muito boa tarde, minhas senhoras e meus senhores. Com imensa
alegria por estar nessa sessão solene, agradeço o convite que me foi feito pela
Presidente da Comissão em Defesa da Mulher Advogada da OAB-PE, Dra. Adriana
Rocha de Holanda Coutinho e pelo Presidente da OAB-PE, Dr. Pedro Henrique
Reynaldo Alves, em nome dos quais cumprimento toda esta insígne Mesa e todas e
todos que estão aqui presentes, mormente as que foram agraciadas com a Medalha
do Mérito “Heroínas do Tejucupapo” aos quais me dão a honra de receber as
minhas palavras. Espero que a qualidade do que aqui será dito, esteja à altura
de tão nobre audiência.
I. Palavra: Em cada uma de suas letras, lança-se uma
semente para o mundo.
É nas palavras que se gesta o significado do mundo. Dá-me a
tua palavra, aquela que te significa, e te direi quem és. Tendo essas premissas
como verdadeiras, passo a fazer a arqueologia da palavra “Pernambuco” para
poder, por fim, encontrar o coração que pulsa em suas entranhas, descobrir de
onde vem e para onde vai o seu sangue. Poderei, então, tocar em sua essência, oh, Pernambuco! E decifrarei a sua alma.
A palavra Pernambuco vem do tupi antigo “Paranambuco” que
significa “cova do mar”, “fenda do mar”. Conversando, recentemente, com o
linguista francês Christian Leray, professor da Universidade de Rennes, ele me
disse se por perplexo pelo fato da palavra mar em português ser um substantivo
masculino e não feminino. Respondi-lhe que, de fato, logo o mar, nascente de
toda a vida, gestante de toda a existência, verdadeiro líquido amniótico que embalsama cada um dos seres com a fonte feminina primordial. Não sem razão a palavra mar em
francês é no feminino, sem falar em sua homofonia “la mer” e “la mère”, ou
seja, ouve-se a palavra “mar”, como se ouve a palavra “mãe”. Mar-mãe, berço da
vida. E é isso que significa a palavra “Pernambuco”, cova do mar, útero da mãe,
ventre de mulher.
Diante disso, peço licença para clamar pelo auxílio de Camões
à minha fala, já que “Cesse tudo o que a musa antiga canta, que um outro valor mais
alto se alevanta”. E esse valor mais alto, gestado nesse ventre, é o valor da mulher pernambucana.
Convido-os a se aconchegarem a meu regaço, como quem se
esparrama sob o teto da copa de uma árvore à beira de um rio de águas plácidas num fim de tarde sobranceira a fim de ouvir histórias. Mas essa não é “qualquer
história” encantada por ser fruto de nossas imaginações. Convido-os a ouvir uma
história especial, pois essa é a nossa história, a história de cada um de nós.
E se ela nos faz sonhar, nos faz sonhar menos por seu encanto ser forjado no sonho e
muito mais por seu encanto ser forjado no real.
II. A Índia Arco-Verde.
Conta-nos o pernambucano Henrique Capitolino em sua
importante obra “Pernambucanas Illustres”, vinda à estampa em 1879, que antes
de ter sido fácil a ocupação da capitania de Pernambuco por seu donatário
Duarte Coelho, esta sofreu grande resistência e obstáculos, estes erigidos
pelos nativos e guerreiros ocupantes dessas terras, os índios tabajaras, também
chamados de caetés. Estes viviam na aldeia indiana de Marim, como era
denominada a Taba dos Caetés, uma humilde povoação nas selvas americanas "com as
suas palmeiras e os seus colmos de palha". Marim dos Caetés vivia em paz sob o
sol dos trópicos, com o seu governo, com a sua religião e com os seus costumes.
Debruçada sobre as margens do oceano Atlântico não tinha por horizonte um dia
ser Olinda, mas ser a eterna Marim. Mas, foi, justamente, nesse local onde
singravam os índios guerreiros iguaras que Duarte Coelho quis fundar a sede de
seus domínios, diante do qual teria pronunciado a frase proverbial “Oh! Linda
situação para uma cidade!”. Com essas palavras foi lançada a primeira pedra do
confronto entre portugueses e indígenas. Inicialmente, Duarte Coelho conseguiu
desalojar os índios, mas estes primitivos senhores do solo sitiaram a nascente
cidade portuguesa e reduziram-na à mais crítica circunstância por falta de
alimentos e foram vencedores. Essa estratégia nos mostra que, apesar de nossos
índios serem tidos como atrasados, de cultura neolítica, em relação aos demais
índios americanos, temos, aqui, o emprego da mesma estratégia utilizada pelos
russos para derrotar Napoleão na invasão da Rússia em 1812. Mas, voltemos ao
“Napoleão de Pernambuco”, o nosso Duarte Coelho.
Duarte Coelho, para a Capitania que lhe fora doada, havia se
dirigido em companhia de sua esposa Dona Brites de Albuquerque e de seu cunhado
solteiro, Jerônimo de Albuquerque. Este último em um de seus inaugurais
encontros com os bravos indígenas locais, perdeu um olho, vazado pelas setas de
suas flechas, e se fez prisioneiro condenado à morte e a alimentar os corpos dos
inimigos. Convém lembrarmo-nos que os nossos índios nativos eram canibais e que
era costume comer o inimigo a fim de adquirir as suas forças e demais
qualidades. Assim como era também, costume - oh! Sensível delicadeza! -
oferecer àquele que no outro dia seria oferecido à tribo como alimento, uma de
suas índias a fim de amar-lhe durante a sua última noite em vida. Esta índia
seria a sua “esposa de sepulcro”. Com Jerônimo de Albuquerque não foi diferente
e quem lhe foi oferecida para adoçar os seus últimos suspiros com a delicadeza
dos frutos, do cauim e dos seus lábios, foi a filha do cacique, a índia Arco-Verde,
também chamada de Tabira, a princesa tabajara orgulhosa, altiva e sedutora.
Amanheceu e com a manhã, também amanhecia uma índia americana inflamada pelo amor, um amor ardente, abrasador, que dardejava nos braços do português à morte condenado. A fim de salvá-lo dessa que também seria a sua condenação, a condenação a uma vida a ser vivida na ausência do que para ela haveria de ser o seu único e definitivo amor, ou seja, a sua condenação à mais triste morte que é a morte em vida, a índia Arco-Verde, desesperada, pôs-se aos pés de seu pai, o Cacique Tabajara. Rogou em lágrimas pelo perdão ao inimigo, pelo livramento da morte daquele cuja morte também seria a sua morte. Envolvido pelas súplicas de sua adorada filha, o Cacique perdoou o seu inimigo branco. Fez-se a aliança de paz entre a tribo e a comitiva de Duarte Coelho, assim como o casamento entre o homem branco, Jerônimo, e a índia tabajara, Arco-Verde, os nossos primeiros “Ceci e Peri” às avessas. Ao fazer a defesa de seu amado e pedir por sua absolvição, Arco-Verde foi a primeira advogada brasileira.
Amanheceu e com a manhã, também amanhecia uma índia americana inflamada pelo amor, um amor ardente, abrasador, que dardejava nos braços do português à morte condenado. A fim de salvá-lo dessa que também seria a sua condenação, a condenação a uma vida a ser vivida na ausência do que para ela haveria de ser o seu único e definitivo amor, ou seja, a sua condenação à mais triste morte que é a morte em vida, a índia Arco-Verde, desesperada, pôs-se aos pés de seu pai, o Cacique Tabajara. Rogou em lágrimas pelo perdão ao inimigo, pelo livramento da morte daquele cuja morte também seria a sua morte. Envolvido pelas súplicas de sua adorada filha, o Cacique perdoou o seu inimigo branco. Fez-se a aliança de paz entre a tribo e a comitiva de Duarte Coelho, assim como o casamento entre o homem branco, Jerônimo, e a índia tabajara, Arco-Verde, os nossos primeiros “Ceci e Peri” às avessas. Ao fazer a defesa de seu amado e pedir por sua absolvição, Arco-Verde foi a primeira advogada brasileira.
Mas, não cessa aqui a história da pernambucana nativa que
possibilitou a Duarte Coelho ter o domínio das terras que lhe haviam sido
destinadas como sua Capitania Hereditária. Que possibilitou a
fundação da Capitania de “Paranambuco” por meio de suas habilidades de advogada
e de diplomata, selando a paz entre os inimigos. A bela e apaixonada Arco-Verde
batizou-se no domingo do Espírito Santo e teve o seu nome convertido para
“Maria do Espírito Santo Arco-Verde”. De sua união com Jerônimo de Albuquerque,
união esta que não recebeu os ritos da Igreja, nasceram oito filhos. Um deles,
dona Catarina, casou-se com Felipe Cavalcanti, fidalgo florentino, consórcio do
qual descende a tão numerosa, até hoje, família Cavalcanti. Outro nobre filho
dessa união foi o distinto guerreiro, Jerônimo de Albuquerque Maranhão, que
juntou seu nome à terra conquistada do Maranhão. Mas, Jerônimo de Albuquerque,
o pai, tampouco foi fiel a sua salvadora, tendo ficado conhecido como o “Adão
de Pernambuco”, gerando um número incontável de filhos para a nova terra lusa.
Não bastasse cumprir com o preceito bíblico do “Crescei e Multiplicai-vos”,
Jerônimo de Albuquerque, como aqui foi dito, não se casou com Arco-Verde nos
ritos da Igreja, mas sim, por ordem de sua soberana portuguesa, contraiu núpcias com
Dona Felippa de Mello, filha de Dom Christóvão de Mello que viera residir em
Pernambuco. Essa foi a paga de Jerônimo de Albuquerque a sua índia salvadora.
Do casamento do português Jerônimo com a portuguesa Dona Felippa não
sobreviveram filhos. Essa foi a paga da Justiça que tarda, mas não falha, e, também. a paga do nosso Destino. Todos os filhos de Jerônimo que povoaram essas terras têm,
também, sangue indígena. Somos todos filhos desse sangue que lançou a gana
abrasadora das índias pernambucanas ao infinito.
III. E falando em Justiça, cabe aqui, e em todo lugar,
fazermos Justiça a tão pouco lembrada, Dona Brites de Albuquerque.
Os romanos em sua proverbial sabedoria já diziam: “a terra é
dos braços daqueles que nela trabalham”. E é por ter em Pernambuco desembarcado
aos dezessete anos de idade e ter em Pernambuco vivido e trabalhado, tido
filhos e netos, derramado o seu suor e o seu sangue até os seus últimos
suspiros, aos setenta anos de idade, sem jamais haver retornado a Portugal, que
não titubeamos em afirmar que Dona Brites de Albuquerque foi uma das nossas
imensas mulheres, ocupando com honras, o Olimpo das pernambucanas.
Como nesse momento já aludimos, Brites de Albuquerque era a
esposa do donatário das terras pernambucanas, Duarte Coelho Pereira. Portuguesa
de nascimento, dona Brites, também chamada de Beatriz, integrava a poderosa
família dos Albuquerque, citados por Camões em seu “Lusíadas” como uns dos
“barões assinalados”. A jovem esposa desembarcou tenramente em Pernambuco nos
alvores do séc. XVI, no ano de 1535, inícios da colonização do Brasil,
acompanhada de seu consorte Duarte Coelho que recebera a posse da Capitania por
doação do el-Rei, Dom João III. Foram precisos apenas alguns anos para que a
adolescente se transformasse em uma mulher de fibra e começasse a exercer com
galhardia o seu poder. Em torno de 1553, ao retornar o seu esposo a Portugal
junto aos filhos desse conúbio, Duarte Coelho de Albuquerque e Jorge de
Albuquerque Coelho, dona Brites, aos trinta e cinco anos, assumiu,
interinamente, o governo da Capitania. Tendo o seu marido falecido em Portugal
no ano seguinte, dona Brites, então viúva e sem o aconchego de seus filhos,
passa a governar a Capitania de Pernambuco, sendo alcunhada de “Capitoa”,
tomando para si todas as obrigações e todas as honras adjacentes ao título. O
seu governo seria resolvido quando o seu filho mais velho, Duarte Coelho
Pereira, que ficou estudando em Portugal junto ao seu irmão mais novo, atingisse
a maioridade. Chegado esse dia, em 1560, os dois irmãos retornaram a Pernambuco.
Duarte Coelho Pereira assumiu o governo, no entanto, tão somente até o ano de
1572 quando ele e o seu irmão Jorge de Albuquerque Coelho foram chamados de
regresso a Portugal a fim de serem incorporados à armada do rei Dom Sebastião
que se alteava sobre a África. Partiram para nunca mais voltarem, pois foram
ambos feridos de morte na batalha de Alcácer-Quibir em 1578. Mais uma vez, dona
Brites, em situação de desamparo pela morte de seus filhos, assumiu o governo da
Capitania, dessa vez, definitivamente, até a sua morte em 1584. Dona Brites
viveu cinquenta anos de sua vida em terras pernambucanas, tendo aqui, como já
falamos, chegado aos dezessete. Desses cinquenta anos, vinte foram governando
essas terras. O seu marido, Duarte Coelho, em Pernambuco viveu e sobre
Pernambuco governou por apenas dezoito anos, no entanto, apesar de serem vários
os monumentos a este dedicados por essas terras e o seu nome clamado
multiplicadamente através dos séculos, dona Brites é uma reles desconhecida
para os pernambucanos. Para esta não foi dedicada sequer um nome de uma rua, de
uma praça, de quaisquer logradouros. Dona Brites que, durante o seu governo,
manteve a ordem e a paz na Capitania, Dona Brites que combateu com firmeza e
serenidade as insurreições indígenas, Dona Brites que legislou e controlou
sobre as mais diversas matérias de interesse dos colonos, Dona Brites que foi
uma exímia planejadora urbana, construindo e urbanizando núcleos tais como o de
Olinda. Dona Brites de quem nada se diz e nada se fala, mas cujos restos
mortais, sepultados na cidade onde viveu e morreu, a cidade de Olinda, tornam
estas terras férteis para aqueles que se nutrem de sua força sem nunca haverem
conhecido nem sequer escutado o seu nome.
Se o primeiro poeta do Brasil, então, terras de Santa Cruz,
foi o pernambucano Bento Teixeira, que deu à estampa o poema épico “Prosopopeia”
em 1601, graças à primeira tipografia brasileira, o “templo de Guttemberg”
estabelecido em Pernambuco, a primeira poeta brasileira de reconhecido valor
não apenas em solo pátrio, mas também, alhures, foi a pernambucana, nascida em
Olinda no ano de 1696, dona Rita Joanna de Souza.
Rita Joanna viveu em uma pacata Olinda em tempos tumultuosos,
nos tempos de grandes heróis como o Zumbi dos Palmares. Apesar de às mulheres,
historicamente, haver sido cerceado o direito à educação, o direito a se valer
da pena da escrita e dos horizontes que se descortinam pela leitura, Rita
Joanna, ainda adolescente, fez estudos de Geografia e de História, tendo escrito
apostilas sobre essas ciências. Dedicou-se à poesia e, também, à pintura. Segundo
Henrique Capitolino (1879), ipsis litteris,
(...) em suas pinturas
matizavam-se os cerros de sua cidade natal, Olinda, os corncheos de suas torres
coroados de nuvens azuladas, a belleza
das noites americanas aclaradas pelos scintillantes raios das estrelas,
ou pela branda e suave luz da lua, os encantos da aurora, a singeleza e graça
das açucenas, cujas caçoulas se abriam com as gotas do orvalho e os raios do
sol! Poetisou as gloriosas tradicções de seus antepassados, os ciumes e arrufos
da altiva Olinda e da humilde povoação dos pescadores que se erguia a seus pés,
os encantos e efflúvios que trescalava o seu coração de mulher, o seu seio
de virgem”(...).
O seu reconhecimento em terras pátrias e em
terras estrangeiras pode ser aquilatado na nota sobre ela feita por J. Norberto
em sua obra “Brasileiras Celebres” de 1862, cujo um trecho dispomos abaixo,
ipsis litteris:
Pernambuco, a provincia
heroica, patria de tantos filhos benemeritos, deve ufanar-se de poder contar
entre os nomes das senhoras illustres, que ha produzido, o da joven Rita Joanna
de Souza, que muito honrou as bellas artes e letras, e de cujo talento fazem
honrosa menção o abbade Barbosa Machado na Bibliotheca Lusitana, Froés
Perim no Theatro Heroino, Ferdinand Diniz no Résumé d’histoire
littéraire du Brésil, o Conselheiro Balthasar da Silva Lisboa nas Notas
Biographicas, e muitos outros.
A
jovem pintora, professora e poeta muito mais poderia ter oferecido a essas
terras e ao mundo, não tivesse a morte lhe colhido em pleno desabrochar. Rita
Joanna desenlaçou-se desta vida aos vinte e dois anos de idade. Pássaro abatido
em pleno alçar de seu voo. No entanto, o seu ascender foi o bastante para
tingir o céu de Pernambuco com as suas cores e inaugurar os versos femininos
nas páginas de nossa história.
V.
Pernambuco: Terra de Cornélias. A Esparta Brasileira.
Se a
afirmação de que “um filho teu não foge à luta” precisa de provas, há provas
mais do que suficientes e cabais na história de Pernambuco. Conhecido como solo
de um povo essencialmente guerreiro, inquieto e desacomodado, esta terra que
foi a primeira a proclamar uma República independente no Brasil, foi palco de
enfrentamentos tais como a Guerra dos Mascates, a Batalha dos Guararapes, a
Confederação do Equador e a Revolução Praieira. E, se no mais das vezes, os guerreiros
eram homens, coube às mulheres pernambucanas o cultivo, a formação e a educação
desses guerreiros. Como forma de desincumbência desse mister, as mulheres
pernambucanas foram, historicamente, verdadeiras Cornélias, mães de soldados
corajosos e combativos.
Como
disse Henrique Capitolino (1879) “no coração das mães residem os nobres
sentimentos que mais tarde hão de germinar no coração dos filhos. Um povo que
possui em seu seio as Cornélias, com certeza terá os Gracos”, em referência à
nobre romana, Cornélia, mãe dos irmãos Gracos, nascida em Roma no século II a.C.. Cornélia
era a filha mais nova de Cipião, herói da II Guerra Púnica. Após a morte do
pai, Cornélia casou-se com um homem bem mais velho do que ela, Tibério Graco,
com quem teve três filhos: Tibério, Sempronia e Caio Graco. Logo depois,
enviuvou. Louvada em prosa e verso como uma mulher cultíssima, de forte caráter
e alta determinação, Cornélia, uma vez viúva, recusou inúmeros pretendentes à
sua mão, inclusive, o rei Ptolomeu, a fim de dedicar a sua vida, exclusivamente, à formação e à educação de seus filhos. Os seus filhos, os Irmãos Gracos,
tribunos romanos, são conhecidos por suas combatividades. E, continua Capitolino (1879): “Antes do
sentimento democratico dos Gracos fazer explosão, já se alimentava e criava no
coração de Cornélia”. Pois bem, muitas e heroicas foram as mulheres pernambucanas que
criaram os seus filhos para resplandecerem e darem o seu sangue, no qual corria
em ebulição o sangue delas, às frentes de batalha. Em suas correntes de apego
materno, jaziam, de mãos dadas, as correntes do desapego, ao ofertarem seus
filhos à inafastável luta.
Quando
vigoravam em Esparta, as leis de Licurgo, as mães cujas criaturas não eram
apenas filhos, mas, primordialmente, cidadãos e soldados, tinham por atribuição
entregar-lhes os escudos das batalhas e o faziam dizendo “com ele ou sobre
ele”, ou seja “vencedor ou morto” e se, porventura, recebiam a funesta notícia de
suas mortes, firmes redarguiam “foi para morrerem pela pátria que eu os criei e
eduquei”. Assim também agiam, com palavras diversas, mas com o mesmo denodo e
força, as mães dos pernambucanos. Dentre essas bravias mulheres estava Dona
Adriana de Holanda, nome que me chamou a atenção, ao pesquisar em meus
alfarrábios, por ser o mesmo da Dra. Adriana de Holanda, advogada, professora e
amiga minha desde as bancas da Faculdade de Direito do Recife e que aqui me
convidou para proferir essas palavras sobre a mulher pernambucana. Dra. Adriana
de Holanda que também é mãe e que desde a sua tenra juventude tem se
desincumbido com heroísmo desse mister. O mister de ser mãe não de guerreiros,
mas de guerreiras, nesse eterno palco de batalhas que dia a dia nos desafiam no
estado de Pernambuco, no Brasil e no mundo. Mas, deixemos cochilando o século
XXI e voltemos os nossos corações ao séc. XVII, que é onde espero que, neste
momento, estejamos todos nós. Dona Adriana de Holanda foi casada com um fidalgo
italiano, Dom Christóvão Lins e com ele deu à luz uma numerosa descendência de
soldados guerreiros que se distinguiram na Batalha dos Guararapes contra os
holandeses e, em especial, nas Batalhas de Porto Calvo onde residia. Dona
Adriana de Holanda teve longa vida e veio a falecer em 1647 com a idade de
cento e dez anos. Longa vida a todas as Adrianas! Seculares Cornélias de seus
filhos, os Gracos pernambucanos!
VI.
As Heroínas de Tejucupapo.
Corria
o ano de 1646. Estávamos em plenas batalhas contra a ocupação holandesa.
Recife, assim como outros pontos do domínio holandês, encontrava-se assolado
pela fome. Os holandeses, com o escopo de guarnecerem os seus soldados de
alimentos, enviaram diversos navios a Pernambuco. Nesses navios viajavam
seiscentos homens sob o comando do Almirante Lichtart. Aportaram na praia de
Maria Farinha ao norte de Olinda e Recife e fizeram os preparativos de
desembarque a fim de iludirem os nossos chefes, pois que levantaram âncora e
dirigiram-se para o povoado de Tejucupapo, pretendendo tomar de surpresa o
povoado de São Lourenço. Sabe-se que naquele tempo os pernambucanos dormiam com
as armas às cintas. Estavam sempre atentos e preparados para a luta. E pobres
dos holandeses ao subestimá-los, pois, antes de tomarem o povoado de surpresa, foram
eles próprios tomados de surpresa, já que o povo de Tejucupapo e de São
Lourenço já haviam tido conhecimento de seus ardis.
Os
habitantes do povoado, em um total de cem, recolheram-se a um reduto de pau a
pique, enquanto que trinta homens mais fortes e mais robustos, montaram-lhe a
guarda. Ao avistarem o inimigo, derrubaram o major holandês com duas balas.
Iniciou-se, assim, uma luta cruel e sanguinária.
As
mulheres ferviam água e distribuíam pólvora aos combatentes, encorajando-os.
Mas eis que percebem que a batalha não será ganha se elas continuarem na
retaguarda, que elas precisam tomar a frente da batalha. Foi quando, uma delas
se assomou do alto do Estacado, tendo em uma de suas mãos, o crucifixo, e na
outra, uma espada, e conclamou as demais à luta frontal com os holandeses.
Outras, também tomaram as rédeas da luta com as próprias mãos. As líderes
atendiam pelo nomes de Maria Quitéria, Maria Ana, Maria Camarão e Joaquina.
Os
holandeses avançavam e eram queimados e eram esfaqueados. Insistiram por duas
vezes e por duas vezes foram obrigados a recuar. Tentaram um último esforço com
uma massa compacta e arrojaram-se contra o reduto armados com machados e outros
instrumentos de destruição. As heroínas redobraram de valor e os holandeses
espavoridos e apavorados em face de tamanho denodo e força, abandonaram o
combate, deixando o campo de luta fincado de cadáveres e de munições. As
mulheres de Tejucupapo, da luta, saíram vitoriosas.
No
dia 07 de dezembro de 1859, Tejucupapo recebeu a visita do então Imperador Dom
Pedro II que, ansioso por conhecer o lugar, assim escreveu em suas memórias de
viagem em 1859:
Às 5 horas da manhã, apesar da
copiosa chuva que caía, o Imperador, que nunca alterou o plano das suas
viagens, partiu para Tejucupapo, como havia resolvido. A povoação é pequena:
mas S. M., que se impôs como dever religioso uma homenagem ás glórias do nosso
passado, foi ali expressamente para ver o lugar chamado Trincheiras, onde as
heroínas Tejucupapenses, essas amazonas que se imortalizaram na história,
roubaram aos homens a glória de defenderem a pátria contra o domínio
estrangeiro. Ainda hoje, se veem ali os fossos e distingue-se bem a forma
regular da construção que é um quadrilátero com o perímetro de 193 passos, que
o Imperador teve a curiosidade de contar, trazendo, para memória deste lugar,
parte do tronco de uma árvore que havia crescido dentro da trincheira.
(Memórias da Viagem de SS. MM. II, Tomo II, pág. 114)
A
magia e a força do feminino que está na origem de todas as coisas,
transformando o caos em vida, nessas memórias do Imperador, revelam-se ao afirmar-se que uma
árvore havia crescido dentro da trincheira. Ali onde jazia a batalha, onde
sangrava a luta, nascera uma árvore. Uma árvore com seus frutos a alimentarem a
paz, a fazerem florescer a vida, mesmo que nos porões da morte. Esse é o troféu,
não recebido por nossas guerreiras, mas, generosamente, ofertado a nós, através
dos tempos, pelas heroínas de Tejucupapo.
VII.
Cuidar e curar. As duas primeiras mulheres brasileiras a cursarem medicina. Uma
delas era uma pernambucana.
Talvez
já esteja ficando enfadonho eu elencar uma mulher pernambucana como tendo sido
a primeira no Brasil a protagonizar feitos e funções, seja como advogada ad
hoc (Índia Arco-Verde), seja como poeta (Dona Rita Joanna), seja como
governadora (Dona Brites de Albuquerque). Mas, não me impinjam essa culpa, se
há alguém para ser culpado, esse alguém é a história e os livros nos quais
pesquisei para ofertar-vos a minha fala!
Pois
então, uma das primeiras brasileiras a seguirem um curso de medicina foi uma
pernambucana de nome Josefa Águeda Felisbela Mercedes de Oliveira. Como já o
dissemos, ela não está sozinha nesse grande feito, mas acompanhada por uma
outra mulher de iguais méritos, a carioca Maria Augusta Generoso Estrela. Ambas
estudaram medicina em Nova York nos
Estados Unidos, já que no Brasil era vedado às mulheres seguirem o curso
médico.
A
professora Elisabeth Juliska Rago, em seu texto “Gênero, Medicina e História”
(2001), nos informa que em finais do século XIX, em Pernambuco, havia uma
polêmica entre as concepções liberais e as evolucionistas. Esta última atribuía
a proclamada “inferioridade” da mulher às razões biológicas. A controvérsia
foi, novamente, trazida à tona pela petição de Josefa de Oliveira nascida em
Tejucupapo (indubitavelmente, um berço de heroínas) aos dias 13 de fevereiro de
1864. Josefa Águeda era poliglota, falando fluentemente inglês, francês e
espanhol, além de versada em História e Geografia, sendo alcunhada pelo jurista
Tobias Barreto como “uma menina inteligente”.
Mas voltemos à petição. No dia 22 de março de 1879, em sessão na
Assembleia Provincial de Pernambuco, o deputado liberal, Tobias Barreto,
defendeu a petição movida por Josefa de Oliveira, representada por seu pai, o
republicano advogado e jornalista Romualdo Alves de Oliveira, solicitando
recursos para fazer o curso de medicina nos Estados Unidos, já que as mulheres
não tinham permissão legal para fazê-lo no Brasil. Josefa Águeda, inclusive,
compareceu aos debates na Assembleia, apesar da tenra idade, alegando que
“precisava do dinheiro para ser útil à sua província”.
Os
argumentos de Tobias Barreto na defesa do pedido de Josefa Águeda figuram como um
dos mais contundentes documentos em prol dos direitos das mulheres, como
podemos, aqui, observar num trecho:
Eu ouso pois confiar na boa
causa que trato de defender, e do culto rendido às excelências do belo sexo,
ouso confiar, repito, que poderei também contribuir com algumas verdades,
seriamente meditadas e francamente expressas, para arredar desta assembleia a
imensa responsabilidade de um pecado imperdoável contra o santo espírito do
progresso, de um crime de lesa-civilização, de lesa-ciência, qual seria sem
dúvida o de ficar aqui decidido, barbaramente decidido e assentado, que a
mulher não tem capacidade para os misteres científicos, para os misteres que
demandam uma alta cultura intelectual. (Transcrição da Sessão da Assembleia de
Pernambuco, no dia 22 de março de 1879.)
O pleito, no entanto, foi recusado pelo
deputado Malaquias Gonçalves. Ainda assim, Josefa Águeda embarcou para a
América do Norte a fim de realizar o seu sonho de tornar-se médica. Durante o
curso no New York Medical College and Hospital for Women, Josefa Águeda
conheceu a carioca Maria Augusta Estrela e ambas se tornaram muito amigas.
Ainda nos Estados Unidos, fundaram o jornal literário feminista “A Mulher” que
foi distribuído em vários estados brasileiros.
Os
cursos de medicina brasileiros passaram a admitir mulheres em suas bancas a
partir de abril de 1879. A primeira médica a se formar no Brasil foi a gaúcha
Rita Lobato, pela Faculdade de Medicina da Bahia em 1887. Ainda assim, a
pressão e o preconceito contra as mulheres médicas prosseguiram ardorosamente,
arrefecendo-se apenas em meados do século XX.
VIII.
Nasce o Feminismo em Pernambuco. A Poeta, educadora e jornalista Edwiges de Sá
Pereira.
Edwiges de Sá Pereira |
Como
aqui já pudemos observar, a mulher pernambucana, cada uma a seu modo, foi
guerreira e batalhadora pela tutela e pela conquista de seus direitos, desde a
nossa Índia Arco-Verde. Entrementes, ainda não havíamos tido um movimento de
características feministas, aquele que não apenas pleiteia pela satisfação de
demandas contingenciais, geralmente, individuais, mas pela satisfação de
demandas gerais e coletivas que redesenhem uma estrutura arcaica,
historicamente patriarcal e opressora em relação às mulheres. Em Pernambuco quem
protagonizou, inauguralmente, esse papel foi Edwiges de Sá Pereira.
Nascida
no dia 25 de outubro de 1884, na cidade de Barreiros, filha do advogado José
Bonifácio de Sá Pereira e de dona Maria Amélia Gonçalves da Rocha de Sá
Pereira, Edwiges começou a escrever poemas desde a sua infância, assim como
começou a ensinar muito cedo. Foi professora Catedrática da Escola Normal,
ensinando Língua Portuguesa, História Geral e História do Brasil. Para além de
educadora, como aqui já o dissemos, foi uma pioneira na luta pelos direitos da
mulher. Em finais do século XIX e inícios do século XX, batalhou pela
emancipação feminina, fosse através de seus escritos e palestras, fosse através
de suas atitudes. Defendeu o divórcio, assim como, junto a Bertha Lutz,
empunhou a bandeira pelo sufrágio feminino. Uma vez conquistado o direito a
votar e a ser eleita, candidatou-se a Deputada da Assembleia Nacional Constituinte
de 1934 pelo Partido Econômico.
Fundou
a Federação Pernambucana pelo Progresso Feminino, tendo participado do 2o
Congresso Internacional Feminista com a tese “Pela Mulher, Para a Mulher”, no
qual classifica a condição da mulher brasileira em três categorias: a que não
precisa trabalhar, a que precisa e sabe trabalhar e a que precisa e não sabe
trabalhar. A proposta era mudar, de forma mais específica, a situação desse
último grupo, as condições das mulheres que tendiam a estarem à margem, quando não, a caírem na marginalidade. Edwiges se propunha a elaborar mecanismos a fim de que esses resgatassem as suas dignidades.
Poliglota
e culta, foi membro efetivo da Academia Pernambucana de Letras, sendo a primeira
mulher no mundo a tornar-se Acadêmica em 1920, quase cinco décadas antes que a
escritora Raquel de Queiroz se tornasse uma imortal da Academia Brasileira de
Letras. Lembrando-nos que Marguerite Yourcenar foi a primeira mulher a integrar
a Academia Francesa e isso, tão somente, em 1980.
Atuou
como jornalista, havendo editado o jornal feminista “O Lírio” e colaborando
assiduamente com diversos órgãos da imprensa pernambucana e de outros estados.
Dentre outros livros, publicou “Campesinas”, “Horas Inúteis”, “Joia Turca”,
“Eva Militante” e “A Influência da Mulher na Educação Pacifista do
após-Guerra”.
Edwiges
de Sá Pereira era irmã do celebrado jurista Virgílio de Sá Pereira, assim como
do conceituado médico, à sua época, Cosme de Sá Pereira, cuja distribuição de
remédios em sua residência deu nome à avenida “Estrada dos Remédios” em Recife. Seu nome consta do "Dicionário de Mulheres Brasileiras: De 1500 até a atualidade". Faleceu no dia 14 de agosto de 1958. O nome de Edwiges é uma inspiração permanente, não apenas para as mulheres pernambucanas, mas para todas que, incansavelmente, lutam por fazer valer os seus direitos e a glória de suas existências.
Se o
direito é arte, a mulher artista pernambucana, desde os seus primórdios, foi
muito melhor recepcionada nas artes literárias, plásticas e dramatúrgicas, vide
as nossas celebradas Rita Joanna, poeta
e pintora, Alexandrina Marinho, dramaturga que escreveu o drama histórico
“Branca Dias dos Apipucos” no séc. XIX e Edwiges de Sá Pereira, poeta e
feminista sobre quem acabamos de discorrer, do que na arte jurídica. Por sinal,
o palco da arte jurídica, o palco da arte do bom e do justo, historicamente, em
Pernambuco, teve as suas cortinas soldadas a ferro e fogo contra a atuação das
mulheres. As nossas Pórcias têm sido, reiteradamente, silenciadas para regozijo
dos Shylocks, rememorando aqui a peça teatral do Mercador de Veneza de
autoria do bardo Inglês William Shakespeare. Inobstante ter-se a possibilidade
de colonização dessas terras, inicialmente, pela intervenção de uma advogada
natural, a loquaz e persuasiva Índia Arco-Verde, inobstante a existência
secular de vocacionadas pernambucanas para o enfrentamento de controvérsias nas
barras da Justiça, a estas couberam as vendas de Têmis, não apenas nos olhos,
mas como mordaças a serem atadas em suas bocas e em suas mãos.
A
primeira advogada brasileira foi Dra. Myrthes Gomes de Campos, fluminense da
cidade de Macaé, inscrita na então IOAB (Instituto da Ordem dos Advogados do
Brasil), seccional do Rio de Janeiro, em 1906. De 1924 até a sua aposentadoria, em 1944,
exerceu o cargo de encarregada pela Jurisprudência do Tribunal de Apelação do
Distrito Federal, que funcionou no antigo Palácio de Justiça, de 1926 até 1946.
Em Pernambuco, arrojadas mulheres fizeram o curso jurídico na Faculdade de
Direito do Recife e se formaram bacharéis, mas tiveram dificuldades de exercer
a profissão como foram os casos de Maria Fragoso, Maria Coelho e Delmira Secundina
em 1888, e o de Maria Augusta C. Meira Vasconcelos em 1889. Por ser uma profissão
que exige o embate direto, a tão imprescindível “luta” prognosticada por
Ihering, o estado de Pernambuco, mesmo sendo herdeiro de heroínas como as de
Tejucupapo, entendeu, através dos séculos, que o exercício jurídico não era uma
vocação feminina. Ou será que estamos falando em monopólio do poder, já que em nenhuma
outra profissão há a possibilidade de se empregar a maior força, a qual
denominamos de força coercitiva, para modificar as relações sociais do que na
profissão jurídica?
Até
a década de setenta no século XX, o Tribunal de Justiça de Pernambuco indeferia
as inscrições de bacharelas em Direito que pretendiam candidatarem-se ao
concurso para a carreira de magistradas, sob o argumento de que as mulheres não
teriam o equilíbrio necessário para proferirem graves decisões em razão de seus
hormônios. Se é assim, por que, então, aqueles que indeferiam as inscrições,
deixavam, e continuam a deixar, a criação de seus filhos e os cuidados de suas
casas, secularmente sob o arbítrio e a cargo das mulheres? Em duzentos anos de
existência do Tribunal de Justiça de Pernambuco, apenas quatro mulheres
chegaram a ser desembargadoras. Este Tribunal está em um desonroso primeiro
lugar no Brasil quanto à ausência de mulheres (apenas 1%). Atualmente, o contingente de juízas na
primeira instância em Pernambuco caminha para a metade do contingente de juízes,
num percentual de 35% do total. Esse
dado revela que não falta capacidade às mulheres para passarem nos concursos da
magistratura e iniciarem carreira, no entanto, uma vez togadas, encontram
muitos entraves políticos para as suas ascensões.
Voltando
à advocacia. Apesar de, atualmente, o número de advogadas em Pernambuco ser
paritário ao número de advogados, sendo, segundo dados de julho deste ano de 2015, o número de mulheres correspondente a 45.8%, nunca tivemos uma Presidente da OAB em
Pernambuco. No que tange às mulheres professoras de Direito, a primeira a
ocupar a função de lente universitária no Brasil foi a paulista Esther de
Figueiredo Ferraz no ano de 1961 na Faculdade de Direito do Largo do São
Francisco. No entanto, a brilhante Dra. Esther que ocupou tantos cargos nos
altos escalões dos governos, como o cargo de Ministra da Educação durante o
Governo do General João Figueiredo, do dia 24 de agosto de 1982 ao dia 15 de
março de 1985, não seguiu a carreira de Professora de Direito de forma intermitente, logo, não construiu uma carreira acadêmica de dedicação exclusiva. Esse pioneirismo com o qual já
estamos tão acostumados fora da órbita jurídica, coube, enfim, à pernambucana Maria
Bernadete Neves Pedrosa, professora de Direito Público da Faculdade de Direito
do Recife e que, a partir de 1964, dedicou toda a sua vida ao ensino jurídico. A
nossa querida e saudosa professora Bernadete Pedrosa, infelizmente, desgarrou-se dessa existência em novembro do ano de 2013. Deixou-nos como legado uma carreira jurídica
exemplar, ética e comprometida. Bernadete Pedrosa tatuou o nosso mundo jurídico
com a efígie das mulheres que inauguram
o seu próprio tempo e constroem uma nova história.
Conclusão
Muito
mais poderia ser dito já que há tanto a ser dito sobre a mulher pernambucana,
minhas senhoras e meus senhores, minhas amigas e meus amigos. No entanto, mesmo
ao abrigo do silêncio, sabemos que nas veias de cada um de nós, reverbera o
sangue secular dessas bravas mulheres hoje por nós reverenciadas. No sangue,
nos atos, nas atitudes de cada uma das Senhoras, hoje agraciadas com a Medalha
do Mérito das Heroínas de Tejucupapo, escorre a força das heroínas daquele
povoado. Força que se revelará a cada geração de mulheres pernambucanas que, incessantemente, plantam e colhem o devenir de nosso Estado.
Pois
a mulher pernambucana, tal como as heroínas de Tejucupapo, trazem,
permanentemente, em uma de suas mãos, não um crucifixo, mas a ternura, e na outra
mão, não a espada, mas a coragem.
É
essa mistura, esse amálgama de ternura e coragem que tem produzido a combustão
e a força propulsora de nossas maiores lutas, de nossas maiores conquistas. E
se a palavra Pernambuco significa cova do mar, fonte criadora, mantenedora e
germinal da vida, o Estado de Pernambuco é esse ventre a cada instante
incendiado. Incendiado não pelos holandeses, incendiado não pelos portugueses,
mas incendiado pela altivez, pela paixão e pela audácia infinita de suas mulheres.
Muito obrigada.
Muito obrigada.
Recife,
auditório do Banco Central, tarde de quarta-feira, aos dias 16 de dezembro de
2015.
Com o então Presidente da OAB/PE, Pedro Henrique Reynaldo e o atual Conselheiro Federal da OAB/PE, Sílvio Pessoa. |
Muito bom. Obrigada. Também escrevo sobre pioneiras portuguesas.
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