domingo, 1 de agosto de 2021

 OS JOVENS SÃO HOJE MAIS CONSERVADORES, TRADICIONAIS E "PRÓ-SISTEMA" DO QUE NUNCA?

A juventude sempre foi identificada, ou até bem recentemente o era, como a idade da rebeldia, aquela na qual se quer mudar o mundo, na qual o sujeito se sente potencializado para invadir as estruturas, remodelá-las, desconstruí-las, extirpá-las. Não à toa, na década de 50 povoou as telas o filme intitulado "Rebeldes sem Causa" estrelado pelos icônicos James Dean e Nathalie Wood, também protagonista do disruptivo "West Side Story". "Hay Gobierno? Soy Contra!" era o lema inconteste dos jovens de espírito livre, contestador e idealista.
Não importa se na meia-idade, premido pelas necessidades de sobrevivência, esse jovem proto-revolucionário tivesse se rendido ao modelo e se tornado "casado, fútil, quotidiano e tributável" nas palavras definitivas do poeta Fernando Pessoa. O mais importante, inclusive para o aperfeiçoamento do próprio modelo, era que esse jovem houvesse, em algum momento de sua vida, desafiado o status quo e, sim, de algum modo contribuído para as suas transformações e realizações de ideais de justiça, bem-estar e igualdade.
Por óbvio que há honrosas exceções. Há jovens, sobretudo, mulheres como Malala Yousafzai e Greta Thunberg que têm, belamente, demonstrado o poder de enfrentamento da juventude. E elas são reconhecidas. Mas, reconhecidas pelo mundo adulto, bem menos pelos jovens, seus semelhantes. Elas não têm milhares de "seguidores" e emuladores, não são "influencers", não mobilizam o grosso da juventude. Não há mocinhas se esforçando por imitá-las, para ser "como elas". Ocupam o lugar quase de "excentrismo".
Ao pensar sobre a esplendorosa Josephine Baker, bailarina, cantora, performer, espiã na segunda guerra mundial, colaboradora da resistência e ativista dos movimentos civis contra o racismo ao lado de Martin Luther King, refleti qual seria a sua congênere nos dias que correm, qual mulher negra americana hoje teria o seu mesmo poder de "influência" e admiração nos dias atuais. E, me deparei com Kim Kardashian, uma socialite que vive da propagação de sua imagem de modo autotélico, aquele que não tem nenhuma outra finalidade que não seja a consagração de si mesma. Não é sequer uma grande artista, consegue, até mesmo, estar à margem do que se entende como a tradicional "indústria cultural" ou "cultura de massas" capitalista burguesa, uma vez que não produz qualquer produto cultural que não seja a sua própria imagem a referendar a aquisição de produtos e recrudescimento do capital circulante. Capital circulante que tem por destino o bolso de poucos, diga-se de passagem. A última notícia que saiu dela foi a de que foi reprovada pela segunda vez consecutiva na BAR, a OAB americana... Inobstante, esse histórico, Kim Kardashian e suas pareceiras, que vivem do nada fazer, mas sim de tudo promover e vender, apenas exibindo as suas imagens, são os ídolos mores da juventude atual com milhares e milhares de seguidores, com milhares e milhares de jovens que "sonham" em ser como elas.
Não estou aqui, fazendo apologia à geração Woodstock, à Contracultura ou o que quer que seja, esses foram projetos disruptivos de juventudes pregressas, que mais do que promoverem shows de rock, foram forças motrizes de transformações, tais como os novos modelos reprodutivos e familiares. A partir do movimento hippie, a juventude, de então, acelerou o desenvolvimento das pílulas anticoncepcionais, propugnou por uma maior igualdade de gênero, em boa medida conquistada, e pela defesa do meio ambiente através do culto à natureza. Em nosso país, a conquista da supremacia da democracia teve uma contribuição fundamental dos movimentos estudantis e de jovens que chegaram ao paroxismo de oferecerem as suas vidas para que pudéssemos gozar do Estado ainda democrático no qual vivemos hoje...
Mais uma vez: Não falo em repetições, mas nos projetos da juventude para o mundo, HOJE!
Ou a juventude se esgotará apenas em consumo, imagem, alienação, manutenção dos (des)valores burgueses, nutrição do sistema capitalista e acomodação aos costumes tradicionais?
Para se "conservar" uma perspectiva de futuro, é preciso revolucionar o presente e não ser "conservador" no presente, o que os jovens têm sido mais do que nunca. Espero que a juventude logo desperte dessa parresia e, já que falam tanto em "lugar de fala", saiam desse lugar de mudez transformadora que nunca foi o dela...

A bailarina e ativista Josephine Baker

A influencer Kim Kardashian


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