sexta-feira, 27 de maio de 2016












Sobre  um  Amanhã  Possível



Há muito pouco a dizer e muito a sofrer.

Chegamos a um paroxismo. O estupro deixou de ser crime no Brasil. Folheio o Código Penal e o encontro entre os crimes hediondos. A reforma do Código Penal em 2009, ampliou-lhe o espectro, tanto quanto aos sujeitos, quanto ao objeto. No entanto, o que vemos é uma total disruptura entre o normativo e a realidade. Se antes, o estupro era um dos crimes de mais difícil prova, crime este praticado intramuros onde só o sabiam o autor e a vítima, hoje, não apenas é perpetrado coletivamente, como é ostentado por seus autores, alardeado em praça pública, até onde os olhos sobre essa praça virtual podem alcançar.

O que nos aconteceu, onde está o nosso elo perdido entre a dignidade e a indignidade humana?

Há menos de uma semana, estava me lembrando do caso Eloá em São Paulo, da menina que foi cruelmente morta por seu namorado que a mantinha em cativeiro. Os grupos de defesa dos Direito Humanos chegaram até lá. Não para defendê-la ou para livrá-la da morte, mas para livrar o rapaz de ser morto.

Qual política de direitos humanos tem sido historicamente implementada, de fato, às mulheres nesse país de modo que, ao propor-se a defender a vida de alguém, arrisca-se a vida da vítima e esforça-se a defender a vida do algoz? A quem serve esse direito penal mínimo que tanto defendemos e que em relação aos crimes contra a mulher, deixa de ser mínimo e passa a ser inexistente?

De onde vem tanta misoginia e tanto ódio?

Se o virtual possibilitou o gesto medonho de ostentar e compartilhar o crime, também nos possibilitou enxergar a realidade da forma mais incontroversa possível. Não cabe mais dizer "ela é louca e está inventando essa história". Afinal é sempre o que resta a  dizer da mulher ao narrar ser vítima de um crime sexual : "Ela tem mente fértil e está querendo prejudicar um homem".

Sei que a dor nos paralisa e que aos solavancos falamos em luta quando estamos todas de luto.

Algo está irremediavelmente morto em nós. E esse algo é imenso.

Que imenso nos seja também o amanhecer que ainda nos promete um amanhã.

Andrea Campos



Sobre o Caso. Via Jornal O Globo:


Na última quarta-feira,25 de maio de 2016, um vídeo postado no Twitter mostrava uma jovem de 16 anos sendo abusada sexualmente por um grupo de homens. A publicação foi feita por um dos mais de 30 agressores que estupraram a menina. A polícia já identificou quatro dos criminosos. 
A jovem passou por exames no Instituo Médico Legal e foi ouvida na Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI). Ela contou que ficou desacordada e, quando despertou, se deparou com os bandidos em cima dela
notícia ganhou as redes sociais e impulsionou campanhas contra o estupro. Internautas trocaram as fotos de perfil e compartilharam imagens que denunciavam o problema, caracterizado como uma questão cultural. O crime ocorreu na Zone Oeste da cidade do Rio de Janeiro, Brasil.

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